Papo com Luiz Berger

Não li em 2015 nenhum gibi tão sujo e grotesco quanto Chuva de Merda. As 52 páginas da coletânea de quadrinhos do Luiz Berger são protagonizadas por criaturas como um rato gigante chamado Robson e seres mutantes de um planeta terra pós-apocalíptico. Um tremendo trabalho, undergound e subversivo como pouco se vê no agitado mundo de quadrinhos independentes brasileiros. Lançada em português pela Ugra Press em seguida a uma edição mexicana, a obra reúne HQs produzidas por Berger entre outubro de 2011 e janeiro de 2015 originalmente impressas em publicações como a GibiGibi, Samba, Prego e outras nacionais e internacionais. O pessoal do Contraversão fez uma crítica com a qual concordo bastante, principalmente em relação às ilustrações do Berger: são incrivelmente detalhadas, dá pra perder muito tempo contemplando cada quadro e página.

Bati um papo rápido por email com o Berger. Ele me falou das origens da Chuva de Merda, as influências do estilo dele e a identidade do quadrinho de humor publicado no Brasil. Saca só:

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Por que o nome Chuva de Merda?

Bom, tem merda em quase todas as minhas histórias, que também são meio merda.

E a revista saiu no México antes de ser publicada no Brasil, certo? Como esse trabalho chegou no pessoal da Ugra?

O Abraham Díaz, editor da JocDoc! do México ia publicar uma coletânea dos meus gibis por lá. Eu topei, fiz as capas, ajudei a traduzir o material etc. Eu gostei do resultado final e resolvi que ia lançar por aqui também, mas como eu tava sem grana pra lançar sozinho, comecei a procurar parcerias. No final eu dividi a grana da impressão com a Ugra Press e foi legal pra caramba. O Douglas e a Dani (donos da Ugra) são muito ponta firme e, como eles ficaram com metade das revistas, eles alcançam um público diferente da galera acostumada a comprar os meus gibis comigo.

Não sou um grande especialista de quadrinhos underground. Quando li o Chuva de Merda vi uma relação entre o seu quadrinho com a obra de pessoas como Robert Crumb e Marcatti, principalmente. Eles são referência pra você? Quem mais serve de inspiração pro seu trabalho?

Sim, cresci lendo os dois e eles sempre foram uma grande referência pra mim. Fora eles, tem uma caralhada de gente que eu gosto muito e acaba aparecendo bastante no meu trabalho, como o Vuillemin, Angeli, Laerte, Mattioli, Jano, Gilbert Shelton… Tem gente nova fazendo gibi que acaba me influenciando também, como o Abraham Díaz, Salomão Montenegro, Victor Bello e Andrew Smith.

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Por algumas entrevistas que fiz com quadrinistas, fico com a impressão que alguns de vocês acabam retratando em seus desenhos muito da forma como vêem o mundo. Você lê o mundo de forma parecida com o que desenhou no Chuva de Merda?

Um pouco, mas eu não sou tão pessimista assim. Não sei nem definir como é minha visão do mundo na verdade. Acho que eu acabo retratando mais a cidade que eu moro mesmo, São Paulo é uma cidade porca, caótica, suja pra caramba e cheia de gente doida fazendo merda, ou você aprende a curtir a estética suja da cidade e da risada da loucura alheia ou você fica doidão também.

Tem muita gente fazendo quadrinho no Brasil e com muitos estilos diferentes. Você se vê mais próximo de algum determinado grupo? Penso no pessoal da GibiGibi principalmente por você ter publicado na revista, mas também vejo um diálogo do seu trabalho com o pessoal que faz a Xula, faz sentido?

Faz sentido. Tanto que é exatamente esse povo que eu costumo sair pra tomar uma cerveja. Tem também o Lobo Ramirez, o Victor Bello e o Pedro Dapremont, que acho que tem bastante a ver com o que eu faço.

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Parte desse conteúdo da Chuva de Merda foi publicado em outros países antes de ganhar essa coletânea. Nessas publicações de fora em que seu trabalho foi publicado, você vê muita semelhança com o que está saindo por aqui?

Vejo muita diferença. Não sei explicar muito bem, mas os gibis nacionais tem muita identidade, que acho que a gente não percebe muito bem a não ser que compare com as coisas gringas. No humor é mais facil de perceber, se você traduzir a Xula pro inglês acho que ninguém de fora vai entender nada, por exemplo, é um tipo de humor muito brasileiro.

E também por essa experiência de ter publicado fora do país, queria saber sua opinião sobre esse movimento recente de publicações independentes. Sempre houve material undergound e independente saindo, mas parece haver uma efervescência atípica hoje em dia. Você vê algo diferente rolando aqui no Brasil?

Sim, e acho que está extremamente efervescente no Brasil também, tanto que agora é possivel identificiar vários nichos dentro do cenário independente nacional, galera do humor, do gibi político, de gibi poético, experimental, etc. Pouco tempo atrás era só “o povo do gibi independente”.

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Ramon Vitral

Meu nome é Ramon Vitral, sou jornalista e nasci em Juiz de Fora (MG). Edito o Vitralizado desde 2012 e sou autor do livro Vitralizado - HQs e o Mundo, publicado pela editora MMarte.

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