Felipe Portugal e a produção do sexto número da Série Postal

Volto a reunir por aqui o depoimento de um dos autores da Série Postal sobre a produção de seus trabalhos para o projeto. Dessa vez, as aspas são do Felipe Portugal, responsável pelo sexto quadrinho da coleção. Lembrando: as falas dos quadrinistas sobre suas respectivas obras para a Série Postal você encontra primeiro lá no tumblr – que atualmente está sendo atualizado com os comentários da Manzanna sobre a sétima edição. A seguir, o depoimento de Felipe Portugal:

“Foi um desafio. Principalmente por conta do tamanho. Toda história é construída em torno do tamanho e do espaço de tempo que ela tem pra ser contada. Nesse caso, se entendermos quadrinhos como tempo no espaço, uma definição que vem do Art Spiegelman, podemos compreender que a ideia de fazer esse quadrinho dentro de um postal faz com que a história seja um tanto quanto curta. Minha dificuldade veio daí. Cheguei a trabalhar com algumas possibilidades em que o quadrinho seria mais complexo do que acabou ficando, mas gosto bastante do resultado final”

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“Justamente pelo fato de eu não estar habituado a receber postais, mandar cartas e esse tipo de coisa, que eu resolvi brincar com o conceito do próprio postal. Pra mim é uma novidade. Pensei, ‘vou fazer um cartão postal, que além de um quadrinho também seja um cartão postal’. Eu queria misturar as duas funções da coisa. Eu achava que todo mundo ia ter a mesma ideia que eu”

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“Acho que todo mundo acaba sendo refém do formato, mas eu tenho um pouco de inveja de caras como o Chris Ware, por exemplo. Ele pode desenhar uma página gigantesca e imprimir as coisas em formatos maiores e pouco usuais. O meu trabalho ainda está muito circunscrito à internet e aí sempre tenho que achar algo que funcione em quatro quadros ou outra coisa que funcione em três quadros, etc… No final das contas acaba sendo um bom exercício, por ser necessário improvisar e tal”

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“Quando fiz o postal, eu tava numa nóia de estudar muito sobre física quântica. O meu próximo projeto de quadrinho mistura muito ciência e filosofia. Então eu estava assistindo bastante Cosmos do Carl Sagan. Nesse tempo eu pensei, ‘como eu posso cruzar uma relação utilitarista de ciência, com o conceito de cartão postal e uma história divertida de ler?’. Foi assim que cheguei nessa narrativa, partindo da esfera mais macro pra mais micro, que são relacionadas a sentimentos de saudade, de um amigo que manda um postal pro outro, aquilo significa muita coisa, mas é só o pedaço de uma árvore…enfim, essas digressões, sabe?”

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“Debato bastante com o Pedro Cobiaco sobre uso de cores. Ficamos sempre nos regulando, nos perguntando qual o sentido dessa cor ou daquela? Enfim, no postal eu também tinha em mente o leitor e refleti sobre a razão de usar cada cor. Tentei fazer o que o próprio Chris Ware faz com as cores dele: tentei usar as cores mais agradáveis possíveis, agradáveis não no sentido da cor ser coerente ou da paleta ser bonita, mas de passar a sensação de um mundo bonito. O Chris Ware diz isso, como ele faz histórias muito pesadas, ele tenta compensar com cores amistosas. Esse rosa e amarelo que usei dentro do quadrinho são muito amistosos, quase infantis. Foi meio nessa vibe”

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Eu me inspirei muito naquele painel do Seth. Pensei nele bastante. O da Rutu Modan é genial, tão bom que resolvi não tentar fazer algo semelhante – uma imagem estática e colocar os balões e o diálogo a parte. Isso me daria mais espaço para fazer um desenho mais bonito e detalhado do que o que acabou ficando, mas ali estava tão completo que tentei investir em outro formato, usando muito quadros, algo que sempre gosto. Isso talvez seja até uma muleta minha pra não desenhar muitos cenários (risos).

Eu gosto muito do Chris Ware e do David Mazzucchelli e eles ocupam ao máximo o espaço da página. O quadrinho do Seth foi perfeito pra isso. Analisei principalmente o espaço que ele estava utilizando, a fonte que estava usando e as cores. Acho até esse quadrinho meio hermético em conteúdo. Não fui por esse lado também, mas em termos visuais e estéticos acho a proposta dele muito foda e casou mais com o meu do que o da Rutu Modan, apesar de eu gostar mais do trabalho dela”

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Ramon Vitral

Meu nome é Ramon Vitral, sou jornalista e nasci em Juiz de Fora (MG). Edito o Vitralizado desde 2012 e sou autor do livro Vitralizado - HQs e o Mundo, publicado pela editora MMarte.

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