O MAU está de volta. O editor Rogério de Campos anunciou a retomada do encarte publicado ao longo das 22 edições da lendária revista Animal, encerrada em novembro de 1991. O 24º número será distribuído de graça, a partir de 10 de setembro, em lojas de quadrinhos e livrarias independentes, também podendo ser adquirido como brinde no site da editora Veneta, com a compra de qualquer livro do selo.
Participam da revista Robert Crumb, Gilbert Shelton, Simon Hanselmann, Martin Rowson, Aline Zouvi, Juscelino Neco, João Pinheiro, Rafa Campos Rocha, Carolina Ito, Allan Sieber, Cynthia B., Gustavo Piqueira e Batista. Autora do livro Uma História da Tatuagem no Brasil, a historiadora Silvana Jeha assina um texto sobre o artista plástico Bispo do Rosário, e Rosane Pavam, editora de texto da Animal, produziu um texto sobre Nereu Gargalo, membro do Trio Mocotó.
“Vamos retomar com o número 24 porque na verdade eu perdi a conta”, disse o editor e idealizador do projeto em meio a risos. “O número 23 existiu de maneiras diferentes na cabeça de tanta gente que aí a gente pula e vai para o 24”.
“A minha ideia inicial era fazer um zine. O que acabou acontecendo é que eu falei com umas pessoas e todo mundo disse que queria participar. O Crumb falou: ‘pode pegar o que você quiser’. Aí o Gilbert Shelton mandou uma história nova do gato dos Freak Brothers, o Fat Freddy. Aí o Martin Rowson fez uma especial, linda. Aí ficou melhor que o meu plano original. E ainda tem Allan Sieber, Carol Ito, Aline Zouvi…. Mas não teve muito planejamento, não”.
E por que retomar o MAU e não a Animal? “A Animal tinha uma certa ambição. Era papel couchê, cor e tudo…. E também porque todo mundo fica me pedindo para ressuscitar a Animal e não vou dar essa satisfação para ninguém. Vai parecer que eu fico atendendo as vontades dos leitores e isso não é uma coisa que me agrada”.
O projeto acabou ganhando fôlego à medida que os artistas convidados pelo editor começaram a enviar seus trabalhos – o que também resultou no corte de algumas histórias maiores que podem ficar para uma possível 25ª edição. Ele disse que apesar de não ter estabelecido nenhum recorte editorial, esse novo MAU reúne histórias principalmente de humor, respostas naturais a tempos reacionários.
“Qualquer sinal de vida é subversivo, né? Esses caras, essa extrema-direita, é anti-humana, né? Então qualquer sinal de vida, de alegria, de risada, de qualquer coisa, é subversão. Dança, riso, samba, rebolado, tudo isso deixa essa gente nervosa”.
Leia a seguir a íntegra da minha entrevista com Rogério de Campos:
“Agora que acabou o mundo, não tem jeito, vamos fazer“
O que você pode me contar sobre esse 24º MAU?
Cara, eu não sei porque eu tô fazendo (risos). A gente fica o tempo todo falando que precisa fazer uma revista, ‘como era bom fazer revista’, e eu fico falando, ‘mas o momento não é mais para isso, agora é mais difícil, não tem jeito’. Mas agora que acabou o mundo, não tem jeito, vamos fazer. Não ia vender mesmo na banca, né? Então vamos fazer desse jeito aí.
Vai ser uma revista?
A minha ideia inicial era fazer um zine. O que acabou acontecendo é que falei com umas pessoas e todo mundo disse que queria participar. O Crumb falou: ‘pode pegar o que você quiser’. Aí o Gilbert Shelton mandou uma história nova do gato dos Freak Brothers, o Fat Freddy. Aí o Martin Rowson fez uma história especial, linda. Aí ficou melhor do que o meu plano original. E ainda tem o Allan Sieber, a Carol Ito, a Aline Zouvi,… Ficou bom, mas não teve muito planejamento, não.
E quando sai? Já está pronta?
Tá pronta, já tá na gráfica. Não sei exatamente o que eu vou fazer. A minha ideia é cobrar o frete, a embalagem, o manuseio e pronto, a publicação seria de graça. A ideia é mandar para os pontos de venda, agitar as pequenas livrarias. Então vai ser de graça no site da editora, as pessoas pagam o transporte, a logística e tal, e as gibiterias recebem e resolvem o que fazer com isso (risos).
Vai ser só quadrinho? Tem texto também?
Tem texto, sim. Tem a Silvana Jeha, autora do Uma História da Tatuagem no Brasil. Ela escreveu sobre o Bispo do Rosário. E a Rosane Pavam, que era a editora de texto da Animal, escreveu um texto sobre o Nereu, do Trio Mocotó, que acompanhava o Jorge Ben, um herói nosso.
“Saudade tem limite“
Mas por que o MAU e não a Animal?
Porque saudade também tem limite (risos). E vamos com o número 24 porque na verdade eu perdi a conta. Aí comecei com o número 24. Mas o número 23 existiu de maneiras diferentes na cabeça de tanta gente que aí a gente pula isso e vai para o 24.
A coleção original terminou na 22?
Eu acho que sim, mas não tenho muita certeza (risos).
Então, de graça, nas lojas independentes e no site de vocês, certo?
É, vai ser nas livrarias independentes, nas livrarias pequenas… Ainda tô vendo como fazer com esse negócio do frete. A ideia é ser de graça com as pessoas pagando os custos da logística. Como se fazia fanzine na época, né? O cara pagava o selo.
“Um monte de gente fica me pedindo para ressuscitar a Animal e não vou dar essa satisfação para ninguém“
Só voltando, acho que você não respondeu, por que não a Animal?
Para falar a verdade, a Animal tinha uma certa ambição. Era papel couchê, cor e tudo…. E também porque todo mundo fica me pedindo para fazer a Animal, um monte de gente fica me pedindo para ressuscitar a Animal e não vou dar essa satisfação para ninguém. Vai parecer que eu fico atendendo as vontades dos leitores e isso não é uma coisa que me agradar (risos).
E como foi o convite para os artistas? Você ligou para o Crumb, explicou o projeto, perguntou se ele tinha algum trabalho…
Não, no caso do Crumb ele falou que liberou o que eu quisesse usar da obra dele. No caso do Gilbert Shelton ele falou que estava preparando um negócio e ia me mandar. Já o Martin Rowson, ele perguntou ‘como você quer e tal?’, aí eu falei que era para ele fazer o que quisesse, ele disse que foi o melhor briefing que já teve.
Como você selecionou os autores nacionais?
Fui chamando as pessoas que estavam mais próximas mesmo. Ficou bastante o povo da Veneta, teve gente que não entrou porque na hora de fechar precisamos derrubar algumas coisas. Ficaram coisas lindas para a próxima, se ela existir. Então foram os autores que estavam próximos: João Pinheiro, Juscelino Neco, Carol Ito… Pessoas que estavam próximas, como acontece em um fanzine.
“Não tem filtro nenhum“
Você passou algum tema ou recorte? Você estabelece alguma linha editorial?
Na verdade eu gastei mais tempo explicando para o povo que não tinha nenhuma linha editorial e não tinha filtro nenhum. A Cynthia B e o Batista queriam fazer uma história grandona e tal, aí não cabia aquilo tudo e eles ficaram com cinco páginas, mas ficou muito bom.
Você falou de “próxima”. Já tem uma próxima edição em mente?
Vai depender desse número. Na verdade a Animal nunca foi mensal, ela saía de vez em quando (risos).
Por que fazer isso agora?
Porque me deu na veneta (risos).
“Qualquer sinal de vida é subversivo“
Com a edição já fechada, você já consegue fazer um balanço dessa revista? O que ela representa para você?
Tem um negócio que eu sinto um pouco de falta, e que a internet até supre um pouco: o humor nos quadrinhos. Acho que o MAU tem esse negócio de humor. Você vê muita produção melancólica… O formato leva um pouco a isso: o quadrinho underground é um quadrinho de humor, principalmente de humor. E com o formato livrão as coisas ficaram um pouco mais sérias, né? Então foi uma diversão.
É, quando eu conversei com o Simon Hanselmann recentemente…
Ele também está na revista!
Ele me falou sobre o papel do humor como subversão.
Ah, cara, qualquer sinal de vida é subversivo, né? Esses caras, essa extrema-direita é anti-humana, né? Então qualquer de vida, de alegria, de risada, de qualquer coisa, é subversão. Dança, riso, samba, rebolado, tudo isso deixa essa gente nervosa.
Post atualizado com a capa do MAU #24: