Papo com Luciana Foraciepe/Maria Nanquim, a editora da Xula

Pode ser que você não conheça o nome Luciana Foraciepe, mas é bastante provável que já tenha ouvido falar na Maria Nanquim. O alter-ego famoso da publicitária está próximo dos 33 mil likes no facebook. No ar desde fevereiro de 2012, a fanpage republica tiras e quadrinhos de todo o mundo, mas principalmente de autores brasileiros alternativos e independentes. Com planos de produzir uma versão impressa do site nos próximos anos, Luciana editou e lançou a Xula, durante a segunda edição da Feira Plana. A revista reúne produções dos quadrinistas Calote, Ricardo Coimbra, Bruno di Chico e Bruno Maron, quatro das mentes mais criativas e subversivas dos quadrinhos nacionais, e está a venda aqui (R$30). Bati um papo imenso por email com a Luciana. Ela comentou sobre as suas prováveis próximas empreitadas no papel, as origens da Maria Nanquim, a criação da Xula, algumas de suas compras na Feira Plana e o atual cenário dos quadrinhos nacionais. Saca só:

Capa-XULA

Você trabalha com publicidade, certo? Como começou a sua relação com os quadrinhos? Quando surgiu o Maria Nanquim e como você define a página? A Xula tá a venda na internet?

Eu sou formada em propaganda e marketing e sempre trabalhei com publicidade. Há uns 2 anos eu tentei “entrar” em alguma editora, mandei currículo, mas nada aconteceu. Não sei se foi a minha experiência, mas achei o mercado editorial bem fechado. Mas a vontade ainda existe.

Minha relação com os quadrinhos vem desde que me entendo por gente. Meus pais sempre assinaram as revistas da Turma da Mônica e da Disney e com 2 ou 3 anos de idade, eu já tentava decifrar os gibis. Minha mãe brinca que eu aprendi a ler com os gibis. Também gostava de Peanuts, Calvin e Haroldo e Mafalda (amo até hoje). Esse trio (Charles Schulz, Bill Wattterson e Quino) é a Santíssima Trindade pra mim. Toda crianca, ao completar, sei lá, 6 anos, deveria ganhar a coleção completa rs Meus pais sempre incentivaram a leitura em casa. Isso foi muito importante na minha formação. Como meus pais também sempre assinaram jornal, na pré-adolescência eu já me interessava pelas tiras do Níquel Náusea (amo de paixão o trabalho do Fernando Gonsales), Laerte, Angeli, Glauco, Adão… amo todos eles até hoje, claro.

O Maria Nanquim surgiu em fevereiro de 2012, se não me engano. Eu postava algumas tiras na minha página pessoal do facebook e meus amigos gostavam. Pensei em criar uma página pra divulgar só as coisas que eu gostava. Já que eu não tenho talento pra desenhar, mas sou apaixonada por desenhos e quadrinhos, era uma maneira de estar mais próxima desse universo. E eu fico feliz com resultado. Eu realmente só posto/ divulgo o que eu gosto. O único critério da página é meu gosto pessoal. Não sou uma estudiosa dos quadrinhos, apenas uma apaixonada.

E no final de 2011, antes da página surgir, eu já tinha tido a ideia de editar uma revista de quadrinhos. Que depois virou a Xula. Lançamos na Feira Plana 2 e estamos vendendo pela internet agora. Aqui o link da lojinha rs http://mariananquim.iluria.com/

Maria-Nanquim

A primeira vez que ouvi falar da Xula foi no meio de 2013, pelo Ricardo Coimbra. O Rafael Roncato estava junto e disse que era o Chinese Democracy dos quadrinhos, pela demora pra sair. A ideia é tão antiga assim?

A ideia é antiga sim rs Surgiu no final de 2011, se não me engano, nem eu me lembro mais hahahaha Era muito fã do trabalho do Calote e do Bruno Di Chico, e acabamos ficando muito amigos. Tive a ideia de editar uma revista só com histórias deles. E talvez chamar um convidado.

Um dia, em casa, nós três ficamos pensando num nome pra revista e surgiu Xula. Pouco tempo depois, conhecemos o Bruno Maron, que tinha acabado de se mudar pra São Paulo, e o Ricardo Coimbra. Também era muito fã dos dois, e acabamos virando grandes amigos. Nos reuníamos em casa toda semana pra falar merda e dar risada. Um dia, eu, Calote e Di Chico conversamos e decidimos chamar os dois pra Xula. Eles toparam, pra nossa felicidade.

Só que como eu trabalhava em agência (até tarde todo dia – quem trabalha em agencia sabe que você não tem horário pra sair) e os meninos também tinham os compromissos deles, a Xula rolou bem devagar mesmo. Quando eu realmente comecei a pegar no pé deles, o Ricardo Coimbra e Bruno Di Chico foram os que me deram mais trabalho hahahahaha Era um parto. O Coimbra prometia entregar as páginas finais dele todo final de semana. Mas elas nunca chegavam. Depois que ele entregou a parte dele, faltava o Bruno Di Chico terminar uma história longa que ele estava desenhando.

E eu fiquei na espera dessa história alguns meses, pra poder fechar a Xula pra Feira Plana 1. Não rolou. E aí, fomos (todos) procrastinando. Mas no fim de 2013, quando soube da Feira Plana 2, resolvi fechar a revista sem a história longa do Di Chico (se um dia ele me entregar, edito um álbum só dele rs Parece que a história já está com 30 páginas, mas ele ainda não finalizou). Pra fechar com chave de ouro, convidei meu ídolo maior, Jaca, para fazer a capa e ele topou. Ficamos muito, mas muito felizes mesmo. A capa da Xula ficou maravilhosa, estou muito feliz. Seremos eternamente agradecidos ao Jaca.

Xula2

Como você define a Xula?

Como eu adoro humor, queria lancar uma revista que as pessoas pudessem dar risada. Defino a Xula como uma revista de humor. O nosso único desejo é fazer as pessoas rirem. Fico feliz quando alguém me escreve que leu a Xula e rolou de rir. Eu sou suspeita pra falar, mas leio e releio e sempre dou risada.

E como foi a produção da revista? Você pensou alguma história? Encomendou algum enredo ou todos tiveram liberdade pra criar o que quisessem?

Não pensei em nenhuma história, a tarefa deles era mandar histórias que me fizessem rir. O critério foi esse. Eles tinham total liberdade. Te confesso que foi bem fácil editar, porque eu sou muito fã do trabalho dos quatro, então, recusei poucas histórias. Poucas mesmo, talvez umas três. E claro que, como andamos sempre muito juntos, tenho um pouquinho de participação em algumas histórias, que surgiram de conversas. Mas nada que tenha que ser creditado, porque o mérito é deles de pegarem alguma coisa absurda que eu disse e transformar aquilo numa HQ.

Pelo que conheço do trabalho dos quatro, são estilos de desenho muito diferente, mas há um certo padrão de conteúdo ou abordagem. Você vê alguma semelhança entre as obras deles?

A semelhança é o gosto pelo humor, pela piada, pelo deboche. Acho, de verdade, que os quatro são grandes humoristas. Sair com eles é certeza de risada a noite toda. E acho legal que esteticamente sejam estilos completamente diferentes. Dá pra saber exatamente quem é quem na Xula, só de olhar pro traço.

Xula3

Como foi sua experiência editando a Xula?

Eu amei a experiência. Quero pagar a Xula logo, pelo menos empatar a grana que eu investi, pra poder investir em outra publicação em breve! O Jaca fez o logo Maria Nanquim, agora já tenho uma marca pra chamar de minha! A ideia é publicar outros artistas que eu gosto. É bom demais pegar a Xula na mão e saber que está tudo do jeitinho que eu queria. É uma revista que eu adoraria comprar, sem falsa modéstia.

Há planos para uma segunda edição da revista?

Sim! Queremos lançar a Xula 2 ano que vem! Talvez na Feira Plana 3.

Como foi a repercussão da revista na Feira Plana?

Foi ótimo. Vendemos quase 180 revistas. Ficamos muito felizes. Um evento desses, deveria acontecer pelo menos duas vezes ao ano. Foi demais. A Bia Bittencourt arrasou.

E o que você achou da Feira? Você chegou a ir na primeira edição? 

Na primeira edição fomos sem a Xula. Ficamos muito tristes, porque víamos nossos amigos vendendo horrores e a gente sem nada pra vender rs Acho que as duas foram ótimas pra quem participou. O público que a Feira atrai é enorme. Muito bom mesmo estar presente.

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Você comprou muita coisa na Feira Plana? 

Olha, eu circulei muito pouco. Tinha que ficar na mesa da Xula, controlando as vendas enquanto os meninos bebiam hahahahaha Mas deu pra ver que tinha MUITA coisa boa. Consegui comprar algumas coisas no final, mas não tudo que eu queria. Comprei tudo que o Rafael Sica levou e que eu não tinha: Novela (que foi editado pela Bebel Abreu, da Bebel Books e está fantástico!!!), uma obra-prima. Fim (editora Beleléu), o zine Manada. Também comprei duas gravuras com tiragem limitada. Isso tudo do Sica.

Comprei o Jornal Pimba, da galera de Brasília, também excelente, sou fã dos caras (Gomez, Daniel Carvalho, Lenadro Mello, Felipe Sobreiro e Danylton Penacho). Fiquei triste porque não comprei os pôsters do Daniel Carvalho, deixei pra comprar na última hora e esgotou. Também comprei um original do DW. Comprei um poster do Góes, maravilhoso. Comprei o fanzine do Jaca e do Fabio Zimbres (ídolos) – eles faziam o zine ali, na hora, um projeto deles que chama Desenhomatic. Bom demais. Comprei um zine da Ale Kalko, que apaixonei, chama Amarelo. Ele vira um poster lindo!!

Na minha entrevista com o Ricardo Coimbra , ele disse que o que acha mais fascinante no atual cenário dos quadrinhos brasileiros “é a chance que as pessoas estão tendo de mostrar um trabalho autoral, uma coisa honesta, verdadeira e sabendo que vai ter público, que tem gente lendo e comentando”. O que você acha desse cenário? Aliás, há um cenário? Pra você, há alguma coisa acontecendo com os quadrinhos nacionais?

Eu acho que o cenários sempre existiu, a duras penas, mas sempre existiu. Agora, com internet, as pessoas conseguem mesmo fazer um trabalho autoral sem depender das editoras. Acho isso bom demais. Mas não sei medir ou dizer se o interesse por quadrinhos aumentou ao longo dos anos, porque eu sempre fui interessada. Posso estar dizendo uma bobagem, mas na minha opinião o cenário sempre existiu, só que antes o acesso era mais complicado. As pessoas tinham que se contentar com o que era publicado. Com o que as editoras publicavam. Hoje, com as publicações independentes e com a internet, dá pra conhecer um monte de gente boa produzindo quadrinhos. Isso é lindo.

Também tem muita coisa ruim, mas aí é só não acompanhar o que não te agrada. O que tenho certeza é que ainda é complicado viver de quadrinhos no Brasil. Vejo isso pelos meus amigos quadrinistas que estão sempre duros. Muito triste. Pessoas extremamente talentosas, mas que precisam sambar muito pra pagar as contas no fim do mês.

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Você já pensou em lançar uma versão impressa pra Maria Nanquim?

Sim! É meu próximo e mirabolante projeto rs Eu quero fazer um tipo de almanaque, com todos os artistas que eu gosto. Estou montando o projeto. Vai sair! Não sei quando, mas vai!

Hoje a página tem mais de 32 mil likes e o conteúdo é bastante alternativo. O que você acha desse número? Você acha que ele já engloba um público além do nicho dos leitores de quadrinhos?

Eu não sei dizer se é muito ou pouco. Pra mim é um número maravilhoso! Mas talvez seja pouco se comparado a outras páginas que postam um conteúdo mais eclético. Eu realmente só posto o que eu gosto. Não adianta nem ser amigo, se eu não curtir o trabalho, não vou postar. Mas é só a minha opinião. Como já disse, não sou uma crítica nem uma estudiosa de quadrinhos, apenas uma apaixonada. Além de quadrinhos, procuro postar trabalhos de artistas plásticos, ilustradores que eu gosto. Se eu gostar, e tiver a ver com a proposta da página, eu vou compartilhar. E se eu não posto, não é porque o trabalho é ruim, é só porque não é o estilo que me agrada. Gosto é gosto né? Quem sou eu pra definir o que é bom e o que não é?

Sobre o público, vejo que tem muita gente que entende de quadrinhos que curte a pagina. Isso me deixa feliz. Quando me escrevem, dizendo que gostam da minha seleção, fico toda satisfeita rs E percebo também que algumas pessoas não são necessariamente leitoras de HQ mas que curtem uma dose diária de tirinhas e de humor, então gostam de acompanhar a página. A única coisa que me mantém no facebook é a minha página.

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Ramon Vitral

Meu nome é Ramon Vitral, sou jornalista e nasci em Juiz de Fora (MG). Edito o Vitralizado desde 2012 e sou autor do livro Vitralizado - HQs e o Mundo, publicado pela editora MMarte.

4 comentários

  1. Sensacional! Amo a página da MARIA NANQUIM no facebook e acompanho o trabalho do Maron e do Coimbra. Comprei a Xula e rechei o bico com a revista! Continuem, please!

  2. Sou fã da Maria Nanquim e da Lu Foraciepe! Inteligentes, divertidas, diferenciadas, extremamente criativas e únicas! Assim são elas! Aplaudo de pé!!!

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