Escrevi sobre Lincoln pra edição de ontem (25/1) do Divirta-se.
Os principais deméritos dos últimos filmes de Steven Spielberg tinham origem em alguns dos mesmos atributos que contribuíram para a construção da fama do diretor. Sentimentalismo aflorado, trilha sonora onipresente e protagonistas extremamente carismáticos estão presentes desde seu despertar para Hollywood, ‘Tubarão’ (1975), ao mais recente e pouco memorável ‘Cavalo de Guerra’ (2012). Lincoln, que estreia hoje (25), contou com o Spielberg que acerta, no controle de suas principais virtudes – e sem excessos.
E não teria sido uma surpresa Spielberg perder a mão em um filme sobre o mais amado presidente da história dos Estados Unidos, ambientado durante o maior confronto bélico já ocorrido no continente americano e com a abolição da escravidão como tema principal. Mas a presença do diretor é sutil como poucas vezes se percebeu em sua filmografia. Sutileza evidente nos belíssimos jogos de sombras e contraposição de luzes, que trazem à tona o domínio técnico que ele tem da fotografia.
As doze indicações recebidas para o Oscar 2013 – incluindo melhor filme, diretor, roteiro, ator (Daniel Day-Lewis) e também ator e atriz coadjuvantes (Tommy Lee Jones e Sally Field) – e o Globo de Ouro de melhor ator dramático, entregue a Day-Lewis, coroam um filme de unidade rara. O excelente roteiro de Tony Kushner, parceiro de Spielberg em ‘Munique’ (2005), foi determinante para esse resultado.
O longa é focado nos instantes finais da Guerra Civil (1861-1865), nos esforços de Abraham Lincoln (1809-1865) para conseguir a aprovação da 13ª emenda constitucional, que tornou a escravidão ilegal em todo território americano.
Para escrever ‘Lincoln’, Kushner partiu da biografia do presidente feita pela historiadora Doris Kearns Goodwin – apenas um trecho de ‘Team of Rivals: The Political Genius of Abraham Lincoln’ será lançado no Brasil, em ‘Lincoln’, da editora Record. Seu texto privilegiou as cenas de longa duração, com diálogos criativos, interpretados por um elenco espetacular.
E também fiz um texto sobre O Mestre.
Ben Affleck reconheceu o “talento excepcional” de seus concorrentes no discurso de agradecimento pelo Globo de Ouro de melhor diretor que ganhou por ‘Argo’. Ele bateu Ang Lee (‘A Vida de Pi’), Steven Spielberg (‘Lincoln’), Kathryn Bigelow (‘A Hora Mais Escura’) e Quentin Tarantino (‘Django Livre’). Em seguida, mencionou um outro, que não havia sido indicado: “Agradeço a Paul Thomas Anderson, para mim um Orson Welles.”
Não foi a primeira vez que o diretor de O Mestre foi comparado ao responsável por ‘Cidadão Kane’ (1941), para muitos um dos filmes mais revolucionários de todos os tempos (e também o melhor). Talvez seja exagero colocar Anderson no mesmo patamar de Welles, mas ‘O Mestre’ reforça a possibilidade de ele ser o cineasta americano que, hoje, tem mais refinamento e domínio das técnicas cinematográficas.
Como em seus outros filmes, foi Anderson que escreveu o roteiro, sobre o relacionamento entre Lancaster Dodd (Philip Seymour Hoffman), líder de um movimento conhecido como ‘A Causa’, e Freddie Quell (Joaquin Phoenix), veterano da 2ª Guerra Mundial e seguidor em potencial de seus postulados. Mas mais do que fé, ‘O Mestre’ trata de dominação e relações de poder, inspirado parcialmente na vida de L. Ron Hubbard, fundador da Cientologia, crença que faz sucesso entre as estrelas de Hollywood – notoriamente o ator Tom Cruise, protagonista de outro filme de Anderson, ‘Magnólia’ (1999).
Hoffman foi indicado ao Oscar de melhor ator coadjuvante pelo papel de Dodd, e Joaquin Phoenix concorre ao de melhor ator pelo errático discípulo. Além disso, Amy Adams, que interpreta a mulher de Dodd, é candidata ao prêmio de atriz coadjuvante. Mas é pouco. Apenas três indicações dentre várias possíveis – sendo melhor filme, diretor e roteiro as ausências mais notórias.
Apenas o sexto longa dirigido por Anderson, é provável que ‘O Mestre’ ganhe reconhecimento com o passar do tempo, assim como foi com os trabalhos de Orson Welles.