A exposição Adágio do Rafael Roncato com as fotos do ensaio nu protagonizado pela quadrinista Laerte chega a São Paulo no próximo sábado, dia 26 de novembro. As 14 imagens ficarão expostas na loja da Ugra até o dia 10 de dezembro. Já falei sobre a Adágio por aqui quando ela rolou na Galeria Hipotética, em Porto Alegre: a série foi produzida em 2013 e publicada parcialmente no mesmo ano na revista Rolling Stone. O evento também apresenta ilustrações exclusivas feitas por Laerte durante o processo de criação do ensaio.
Fui convidado pra bater um papo com o Roncato no dia da abertura da Adágio lá na Ugra, a partir da 16h. Acompanho os trabalhos do fotógrafo desde os tempos do projeto .nankeen. e tenho certeza que a conversa rende. A rota e as instruções pra abertura do evento tão na página da exposição no Facebook. Vamos? Adiantei com o Roncato alguns dos temas que devemos tratar no sábado em uma troca rápida de emails. Dá uma lida:
A exposição tá vindo pra São Paulo depois de ter passado um período na Galeria Hipotética. Como foi a experiência em Porto Alegre?
Não poderia ter sido melhor, para falar a verdade. Algumas imagens já haviam rodado individualmente por exposições coletivas – como no 6º Festival de Fotografia de Tiradentes e a 6ª Mostra SP de Fotografia São Paulo, além da publicação chilena Guerrilla – e Porto Alegre acabou virando um teste para o ensaio como um todo por ser a primeira cidade a receber todas as imagens. Eu não sabia o que poderia acontecer, como seria a recepção, se a exposição seria bem visitada ou um fracasso. E no final deu tudo certo. Fiquei muito feliz pelo convite do Fabiano e da Iriz, da Galeria Hipotética, e toda a garra que eles colocaram para montar a exposição da melhor maneira possível, dentro do jeito que eu havia imaginado. Tive a oportunidade de conhecer muita gente bacana, desde fotógrafos até quadrinistas que só conhecia pela internet ou nos livros. Foi uma festa das boas e ainda consegui produzir novos retratos dos quadrinistas de lá para o .nankeen..
E A Adágio chega a São Paulo com o mesmo formato da exposição no Rio Grande do Sul? São as mesmas imagens?
As 10 imagens que estavam em Porto Alegre também estarão na Ugra, juntamente com os esboços da Laerte para o projeto. A diferença desta vez é que resolvi acrescentar 4 novas imagens e mudar um pouco a disposição delas ao tentar conversar com o espaço da Ugra. Quando montei a exposição na Hipotética me dei conta de que este projeto poderia sofrer alterações conforme é exposto. E lá mesmo eu troquei a ordem das imagens e testei um formato que não imaginava. Eu gostaria de ter esse desafio de dar uma nova cara ao trabalho a cada nova exposição. Penso que o trabalho futuramente possa trazer cada vez mais imagens abstratas, tirando o peso do rosto, do referente, da Laerte.
Em Porto Alegre você conversou com os visitantes da exposição? Houve alguma reflexão particular sobre as fotos por parte do público que chamou sua atenção? A partir desse contato você fez alguma nova leitura sobre esses trabalhos?
Conversei com algumas pessoas tanto na abertura quanto no período de montagem. O interessante é notar como as imagens são recebidas por cada pessoa: há os que se detém mais na técnica, outros na disposição e plasticidade das imagens, os que se interessam por ser um nu da Laerte e pela curiosidade de como é seu corpo… A minha alegria foi perceber o interesse legítimo com o projeto não apenas por retratar a Laerte, mas por tocar em questões de corpo, identidade, gênero, sexualidade, de uma forma poética e respeitosa. Claro que é um trabalho sobre e com a Laerte, mas esta não é a única camada de leitura possível ali dentro.
Lembro de um comentário sobre como as fotos eram simples demais e poderiam ser muito melhores. Sim, elas poderiam ser muito melhores, ainda mais com uma outra visão sobre a Laerte ou para onde o trabalho deveria ir, mas a questão ali não era trazer apenas lindas imagens. Não estou aqui para agradar. Quero relembrar certas questões, gerar discussão, fazer pensar. Desde o princípio minha ideia era ter as imagens mais simples, sem interferências além do próprio corpo e da tinta.
Eu tenho visto bastante repercussão na imprensa sobre a exposição – tanto a da Ugra quanto a que rolou na Galeria Hipotética. Você imaginava esse barulho? Você vê algum motivo particular pra imagem da Laerte chamar tanto a atenção das pessoas?
Eu estaria mentindo se dissesse que não esperava certa repercussão sobre este trabalho. As pessoas são curiosas e acredito que ainda acontece o “ver para crer”. No final das contas ainda é um nu da Laerte e isso gera um burburinho; da mesma forma que gerou quando algumas imagens saíram na Rolling Stone anos atrás. Não gostaria que as pessoas vissem apenas esta camada do trabalho, um nu da Laerte, mas que pensem o que isso significa e quais questões permeiam. Adágio não traz apenas a Laerte cartunista, mas ela como trans, como mulher, como dona de seu corpo e também na luta por direitos iguais e respeito para com todos. Laerte é importante por todos estes pontos que se conectam na potência da sua atuação e imagem.