ZIP – Quadrinhos & Cultura Pop (Editora Metrópoles) é o primeiro livro do crítico e pesquisador Ciro Inácio Marcondes, um dos editores do blog Raio Laser. Uma das principais referências nacionais em termos de reflexão sobre histórias em quadrinhos, Marcondes reuniu na obra 70 dos principais textos da coluna homônima ao livro publicada durante três anos no portal brasiliense Metrópoles. A obra não se limita a tratar de HQs, mas quadrinhos são o principal foco de suas 352 páginas.
Fui leitor assíduo de Marcondes ao longo de seu período publicando a ZIP, assim como sempre acompanhei o trabalho dele no Raio Laser – inclusive mediei a edição especial do podcast Lasercast celebrando o aniversário de 10 anos do blog, já ouviu? Por isso ressalto a importância da coletânea da ZIP não apenas por seu registro da história recente dos quadrinhos lançados no Brasil, mas principalmente pelas ideias e análises singulares apresentadas por seu autor.
Bati um papo com Marcondes sobre ZIP – Quadrinhos & Cultura Pop. Entre outros temas, falamos sobre o ponto de partida da coluna, a edição do livro, a relação de quadrinhos com outras linguagens, a crítica brasileira especializada em HQs e os principais focos de interesse dele hoje em termos de gibis. Conversa bem legal, saca só:
“O projeto ZIP certamente foi bem além do que eu havia despretensiosamente imaginado no início”
O livro ZIP é uma coletânea dos textos da coluna ZIP, que você publicou no Metrópoles durante três anos. O Metrópoles é um site de grande circulação e alcance. Você pode contar, por favor, como surgiu a coluna? Qual foi a encomenda feita a você para a coluna?
Quando comecei a ZIP em 2017, já fazia a Raio Laser desde 2011. E a Raio Laser era um blog (ou espécie de revista eletrônica), como é até hoje, que buscava pensar quadrinhos de forma ampla e aprofundada na medida do que fosse possível. Mas a Raio era conhecida também sobretudo por ser de autores de Brasília (por exemplo eu, Pedro Brandt e o Lima Neto), que cobria bastante a cena local. E talvez nem todos saibam, pois hoje o Metrópoles é nacional, mas ele fica sediado em Brasília. Eu dou aula em cursos de Comunicação aqui no Distrito Federal há mais de 10 anos, e venho de uma família de jornalistas. Então conhecia bastante gente que trabalhava no Metrópoles, incluindo ex-alunos meus, entusiastas do meu trabalho na Raio Laser. Daí tive a ideia de propor uma coluna (ou um dos “blogs”, que existem até hoje) que fosse uma espécie de “Raio Laser light”. Pra quem conhece a Raio, sabe que a gente faz um trabalho de texto muitas vezes inviável para qualquer meio mais comercial ou de grande alcance. Textos muito longos, às vezes muito idiossincráticos ou acadêmicos. Então propus a eles que fosse uma coluna voltada mais aos fenômenos mainstream da cultura pop (tipo super-heróis, séries, desenhos animados), com tom mais iniciático, porém sem perder o rigor que sempre me coube nos meus outros trabalhos. Essa era a proposta inicial, que foi acatada. Na medida em que a coluna foi evoluindo, no entanto, acabei mudando um pouco o escopo e adensando as análises.
E como foi para você a experiência de levar a ZIP ao longo desses três anos? O fato de ser uma coluna em um portal noticioso, sobre generalidades, determinou de alguma forma o conteúdo dos seus textos e a sua escrita?
A experiência foi excelente, eu diria que a melhor possível. Às vezes me pegava pensando “devo ser um dos únicos caras do Brasil que de fato tem um salário pra escrever semanalmente sobre quadrinhos”, o que me deixava bastante surpreso. Eu escrevo em sites, sobre coisas diversas (como cinema, música, etc.) desde o início dos anos 2000, e sempre tive muita disposição pra esse negócio de texto, coluna, opinião, etc. Foi por isso que fundei a Raio Laser. Como eu disse na resposta anterior, a ZIP acabou se transformando com o tempo, foi ficando mais “quadrinhos além” (como é o lema da Raio), mas isso não significa que eu não fosse limitado pela natureza jornalística do Metrópoles. Meus textos eram editados, muitas vezes cortados, quase todos os títulos que eu dava eram trocados, e às vezes eu era simplesmente pautado. Eu entendia que esse era o processo de qualquer redação jornalística, então não chegava a ser nada traumático. Também, como sou professor universitário, muitas vezes meu tempo ficava muito curto, e eu tinha que escrever esses textos na pressão de uma ou duas horas. O livro resgata os textos tal que eu os concebi originalmente, e eles são ampliados por notas de rodapé.
Os textos do Ciro pesquisador não são os mesmos do Ciro da Raio Laser, que também são diferentes do Ciro da ZIP. É fácil para você transitar nesses diferentes ambientes? Você consegue ligar e desligar com tranquilidade a chave para cada “modo Ciro” de escrita em função dos espaços que está ocupando e do que você está se propondo a fazer?
Como eu disse, escrevo desde muito cedo. Há ainda outros modos, como “Ciro escritor”, “Ciro poeta”, etc. Uma coisa que está na minha tese de doutorado é que cada forma de pensar é uma frequência na mídia invisível da razão, e eu tenho plena consciência de que preciso mudar essas frequências quando devo escrever em outro registro intelectual. Um texto para a Raio Laser é rigoroso, mas é uma navegação longa e sem muitas interrupções de um “superego”, digamos assim. Ali eu escrevo absolutamente tudo o que quero, em termos de estilo e conteúdo, sem me preocupar com mais nada. Na ZIP eu tinha uma série de limitações, como tamanho (me pediam no máximo 1,5 páginas, mas eu quase sempre ultrapassava), a popularidade do tema, a clareza na comunicação, etc., mas eu sempre procurei usar isso como obstruções úteis, justamente para testar essas outras frequências. Já um texto acadêmico é uma espécie de edifício intelectual que você constrói, extremamente rigoroso, lapidado obsessivamente, e submetido a muitos critérios.
“Acho que filmes, quadrinhos, desenhos animados, livros, música e arte fazem parte da mesma família“
A coluna e o livro são principalmente sobre quadrinhos, mas não exclusivamente sobre quadrinhos – e acho que isso reflete um pouco do interesse público crescente em HQs e da percepção de quadrinhos como parte da indústria do entretenimento. Como você vê essa mudança de olhares leigos em relação aos quadrinhos? Aliás, você vê essa mudança?
Quadrinhos sempre fizeram parte de fenômenos transmídia, isso não é nenhuma novidade. Aliás, estou saindo agora para fazer um pós-doutorado em que vou procurar verificar como ocorriam estas interfaces ainda no final do século XIX e começo do século XX. De que maneira quadrinhos e cinema, por exemplo, já se comunicavam diretamente no nascedouro das formas modernas destas mídias? Séries, por exemplo, não são novas: já eram exibidas nos cinemas na década de 1910, e eram muito populares. Escrevi muito sobre as incríveis séries fantásticas de Louis Feuillade na minha tese de doutorado. Acho também que as pessoas perderam um pouco a noção da popularidade que alcançavam por exemplo aquelas séries antigas do Flash Gordon, Superman do George Reeves, etc. Portanto, acho que, mais do que uma mudança, há um continuum, que se exponenciou com as proporções colossais que a indústria do entretenimento alcançou na era do neoliberalismo, dos grandes conglomerados de mídia. Porém, eu particularmente não gosto de pensar as coisas de forma compartimentada. Imagem e texto são coextensivos. Acho que filmes, quadrinhos, desenhos animados, livros, música e arte fazem parte da mesma família.
Quando e como surgiu a ideia para o livro? Qual foi o seu filtro para os textos que entrariam e ficariam de fora da edição? Como foi o processo de edição do livro?
Chega a ser irônico, porque, afinal, a coluna foi cancelada em 2019, mas eu e o Pedro Brandt (da Raio Laser) achávamos que, no final das contas, um material rico tinha emergido da ZIP, e sabíamos que o Metrópoles tinha um editora nova interessada em publicar material dos autores do próprio portal. Então, propusemos isso ao Luiz, editor-chefe, e colocamos o Pedro Brandt como coeditor. Acho que vendemos bem o peixe, porque o projeto foi aceito, mas tocado um tanto lentamente. Lá se vão dois anos desde que começamos a trabalhar no livro. O principal filtro para selecionar os textos era o texto em si. Se ele não tivesse uma certa graça (às vezes literalmente), ou não fosse uma análise bacana, bem refinada, acho que não valia a pena. Era preciso que o livro mantivesse a intenção de ser iniciático, para o leitor novo (intenção que havia na coluna), mas também que minhas marcas enquanto crítico se mantivessem. Muitos textos eram pautas quentes, entrevistas, etc., e tudo isso foi limado. Textos de fraca inspiração, ou que fossem sobre um assunto muito local ou desinteressante, também saíram. Depois, com os 70 textos selecionados, pensamos que eram tantos gêneros, movimentos e autores, que valia a pena tentar costurar algum tipo de narrativa, tirá-los de ordem cronológica, refazer tudo em um sentido mais livresco mesmo. Daí veio a divisão em seis capítulos, e escrevi uma introdução especial para cada um deles.
“O que mais me interessa em termos de quadrinhos hoje é o passado”
Você pode falar um pouco, por favor, sobre a concepção da capa do livro? O Pedro D’Apremont é um colaborador de longa data da Raio Laser. Por que chamá-lo para fazer a capa do livro? Qual foi a encomenda que você fez a ele para essa arte? Como foi a dinâmica entre vocês até chegar na arte final?
Conheço o Pedro D’Apremont desde 2013, quando fui seu professor na disciplina “Oficina de Histórias em Quadrinhos” na Faculdade de Comunicação da UnB, quando fiz estágio docente lá. Curiosamente nesta mesma turma estavam outros quadrinistas que hoje têm dimensão nacional, como Lovelove6, Lucas Marques e Diana Salu. Fiz muitos amigos nesta turma, e Pedro foi um deles. É um cara inteligentíssimo, que me apresenta inúmeras referências legais de tudo quanto é tipo de coisa, e me coloca num outro radar. Além disso, é um artista que evoluiu, digamos, gargantuescamente nestes anos. Ele é um mestre em processar suas referências sem que elas transpareçam ou pareçam cópias de outras coisas. Acho o estilo dele o mais, digamos, “cool” do quadrinho brasileiro atual. Seu traço tem uma pegada que lembra os indie comics americanos, mas ao mesmo tempo é bem brasileiro, e bem brasiliense. Tipo uma mistura de Daniel Clowes com black metal e uma pitada de Legião Urbana (foi mal Pedro!). O desenho dele tem essa coisa esperta e “low profile” que faz parte da cultura daqui de Brasília. Acho que combina com meus projetos. Ele ilustrou camisetas nossas, o banner atual da Raio, inúmeros cartazes, etc.
Para a capa do livro, primeiro eu pedi pra ele pensar livremente, que tivesse suas próprias ideias, a partir do que entendia do projeto. Ele pensou muitas coisas loucas, e fez vários rafes. Cada ideia parecia melhor que a outra, e foi difícil chegar nessa capa final. Lembro que ele sugeriu uma ideia que parodiava a clássica capa “elétrica” da Zap comix, só que comigo como personagem, e escrito “ZIP”. Em outra, ele propôs desenhar o Ignatz (do Krazy Kat) tacando um tijolo na minha cabeça, com a onomatopeia “zip”, que era típica desse quadrinho, como título. Genial! Creio que a capa final, com esse aspecto meio “Steve Ditko”, foi coletivamente pensada por mim, por ele e pelo Pedro Brandt. Muita coisa nessas concepções depende de com sai no rascunho, e lembro que desde sempre o rascunho da capa final nos impressionou muito: dava pra demonstrar a introspecção do trabalho, botar uns easter eggs, revelar meus malditos vícios, etc. Sou muito grato ao Pedro D’Apremont porque ele teve de retrabalhar essa capa milhões de vezes.
E como foi a sua experiência concebendo e desenvolvendo o livro? Qual balanço você faz desse “projeto ZIP” (entre o início da coluna e a publicação do livro)?
Esse é o meu primeiro livro. Estou muito feliz com ele. Foi extremamente trabalhoso chegar ao resultado final especialmente porque, além de tocar a Raio Laser, o Lasercast e participar de projetos em cinema e quadrinhos, eu sou professor universitário. E este é um trabalho que consome muito tempo e energia, e é um trabalho de imensa responsabilidade. Então o projeto do livro foi sendo gestado lentamente, quando dava, mas ele acabou sendo acelerado nos últimos meses justamente porque eu precisava lançar antes de sair do Brasil, no começo de setembro, para fazer esse pós-doc. O projeto ZIP certamente foi bem além do que eu havia despretensiosamente imaginado no início. Não posso reclamar, é uma grande alegria deixar alguma contribuição ao mercado editorial de quadrinhos do Brasil. O que eu aprendi com ele é isso que aprendo em quase todos os meus projetos: sementes plantadas lá atrás germinam coisas bonitas lá na frente. A vida é um jogo de paciência. Requer, ao mesmo tempo, uma combinação de planejamento e aleatoriedade, de foco, rigor, e espontaneidade, despretensão. Mas ei! Quem disse que o projeto acabou? Talvez haja mais novidades…
Você já escreve e pesquisa sobre quadrinhos há alguns anos. O quanto o seu interesse sobre HQs mudou ao longo dos anos? O quanto o seu foco de estudos e interesses mudou do início de sua vida profissional/acadêmica com HQs até os dias de hoje? O que mais te interessa hoje em termos de histórias em quadrinhos?
Quando lancei a Raio Laser em 2011, achava que o conteúdo sobre quadrinhos na internet era essencialmente jornalístico, muitas vezes amador. Não que eu não fosse também amador, mas o slogan “quadrinhos além” servia pra gente procurar pensar os quadrinhos como fenômeno cultural complexo, de dimensões filosóficas, estéticas, sociológicas, etc. Terminei meu mestrado em 2008, e estava empolgado em empregar algumas coisas que havia aprendido nessa pesquisa (no caso, sobre cinema) também nessa função de escrever crítica de quadrinhos. Daí veio uma multidão de textos loucos e erráticos, muitas vezes equivocados (outros ainda hoje certeiros), sobre quadrinhos e diversas outras coisas: filosofia, filmes, livros, etc. Sempre pensei a mim mesmo como um cara muito transdisciplinar. Tanto que eu me formei em Letras, fiz mestrado em literatura, doutorado sobre cinema, dou aula na Comunicação e tenho um livro sobre quadrinhos. Quem conhece minha trajetória como professor e pesquisador sabe que a coisa sobre a qual mais escrevi na vida foi cinema mudo. Então essas flutuações são sempre assim, e me interessam que sejam assim. Esta nova pesquisa de pós-doc tenta juntar tudo: comunicação, filosofia, cinema mudo, quadrinhos antigos, etc. E, como sempre, o que mais me interessa em termos de quadrinhos hoje é o passado. Ali é que está a verdadeira fonte da juventude. Num Pogo, num Li’l Abner, num Little Orphan Annie, num Bécassine, Les Pieds Nickelés, etc. Tenho lido os livros do Töpffer, absolutamente encantado. Aquilo ali já era romance gráfico! Se em algum momento pensarmos que os quadrinhos se estagnaram, basta voltar ao começo, às comic strips. Ali havia tantas invenções que a gente até se esquece de grande parte delas. Defendo isso também para o cinema, para a literatura, para a música, etc. O novo só vem se olharmos adequadamente ao passado. A prática da arqueologia das mídias.
“A crítica e o jornalismo estão submetidos a uma lógica perversa, que é a das condições dadas para que os algoritmos deem visibilidade à sua produção de conteúdo”
Qual balanço você faz da crítica, do jornalismo e da produção de conteúdo especializado em quadrinhos no Brasil atualmente? Sei que é uma pergunta bem abrangente e generalista, mas você consome muito conteúdo sobre histórias em quadrinhos? E você gosta do que lê/ouve/assiste?
Olha, certamente está bem melhor que em 2011! Com certeza ainda somos muito pequenos, em qualquer dimensão que se olhe. Gravamos um Lasercast sobre isso com o Alexandre Linck, do Quadrinhos na Sarjeta, que tem uma entrada muito legal tanto com o público acadêmico, quanto com o público geral de quadrinhos, e discutimos muito os paradoxos da circulação de quadrinhos no Brasil hoje. Há muitos canais de Youtube e contas no Instagram, mas eu diria que 90%, não importa o público, não acrescentam nada aos seus ouvintes. A crítica e o jornalismo estão submetidos a uma lógica perversa, que é a das condições dadas para que os algoritmos deem visibilidade à sua produção de conteúdo. Uma lógica utilitarista, vinculada a uma mecânica de monetização e a uma autoexposição quase pornográfica da figura do jornalista, do crítico ou do youtuber. O texto, o conteúdo em si, importa menos que uma performance direcionada a uma sistemática de cliques que sabemos ser robótica e viciante. Além disso, há a perda do texto, que acho muito grave. Nossa sociedade foi estruturada na linearidade proposta pela lógica textual. A quebra desse paradigma com a digitalização de tudo tem ainda consequências imprevistas, mas não me parece estar indo num caminho legal, já que parecemos estar dando nossa intimidade de graça para corporações despidas de humanidade e que parecem oferecer muito pouco, socialmente, em troca. O texto é uma modalidade muito rica e complexa de pensamento (e é ridículo ter de ressaltar uma obviedade dessas), e perdê-lo, eu acho, leva a uma reação em cadeia de desinformação e suspeição em relação à realidade.
Mesmo assim, eu consumo sim muito do que é produzido em termos de circulação de informação sobre quadrinhos no Brasil. Há canais que fazem um grande serviço, como o próprio Quadrinhos na Sarjeta, o Ilha Kaijuu, o Formiga Elétrica, o Pipoca e Nanquim, etc. Sinto falta de uma tradição textual que já tivemos academicamente, ou mesmo de jornalistas que coloquem a crítica de quadrinhos dentro da chave da crítica cultural, como aqui no Brasil faz o André Forastieri em relação à música, ou o falecido Cid Nader fazia em relação ao cinema. A crítica como produção cultural. É por isso que valorizo muito o trabalho do Vitralizado, do Érico Assis, do Thiago Borges, do Ticiano Osório, do pessoal do Balbúrdia. Ou o de revistas como Plaf, Banda e Mina de HQ. Cada um desses, com suas iniciativas (muitas delas heróicas) faz resistir isso que acho que está sendo trocado por outra cultura, muito videográfica e digital, que tem proporções maiores, mas cujos resultados ainda são incertos para a cultura de quadrinhos e para o crescimento da mídia.
Você pesquisa e dá aulas sobre quadrinhos, tem um blog e um podcast sobre HQs e agora está publicando um livro. O que você ainda planeja fazer relacionado a quadrinhos que ainda não teve oportunidade para fazer?
Ora, essa é fácil! Fazer meus próprios quadrinhos! Eu não desenho, mas vivo bolando ideias de histórias, geralmente coisas meio megalomaníacas que envolvem surrealismo jodorowskyano, ficção científica subversiva e algumas coisas moralmente ultrajantes. Tem uns três romances gráficos na minha cabeça. Vamos se algum dia encontro uma pessoa louca o suficiente pra embarcar nessa comigo. Na minha adolescência eu escrevia muitos contos, e tem ali ainda algumas ideias que podem passar por um “revamp” e ficarem mais legais.
Qual a memória mais antiga da presença de quadrinhos na sua vida?
As minhas memórias mais antigas, curiosamente, estão associadas à minha própria produção infantil. Como eu era uma criança introspectiva, passava horas e horas de meus dias, durante anos, fazendo quadrinhos. Isso desde que eu tinha uns 7 ou 8 anos. Eram histórias bastante engraçadas, bem surtadas, de um jeito ao mesmo tempo cotidiano e surrealista, sobre dois irmãos extremamente idiotas e paspalhos. Desde pequeno sempre apreciei um humor muito sarcástico. Desenhar aquilo era a minha vida. Ninguém lia, mas a gente se envolvia naquela potência solipsista infantil. Foram anos de plena realização artística, que nunca precisei mostrar pra ninguém e nem dar continuidade enquanto adulto. Tudo se resolveu ali naquela prática que depois se transmigrou para outras coisas. Tem um texto sobre isso no livro, e é o meu favorito de todos.