Pedro Cobiaco e a produção do segundo número da Série Postal

Continuo reunindo lá no tumblr da Série Postal depoimentos dos artistas envolvidos no projeto sobre a produção de seus quadrinhos pra coleção. A ideia é sempre divulgar as falas com exclusividade por lá e depois de algumas semanas reunir o conjunto de cada autor em um único post por aqui. Tá a mil no tumblr o making-of do trabalho da Taís Koshino pra terceira edição, então já tá na hora de reunir no Vitralizado os depoimentos do Pedro Cobiaco sobre o número dois. São falas que não pretendem esgotar as HQs por completo, só aprofundar um pouco mais os temas e conceitos tratados em cada HQ. A seguir, aspas do Pedro Cobiaco:

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“Enquanto eu pensava no que faria com o postal, a primeira coisa que veio a mente foi essa ideia de me dirigir a uma pessoa. Isso é algo muito presente no meu trabalho até. Eu queria escrever como se estivesse escrevendo para alguém. Mesmo sabendo que é no verso do postal que geralmente escrevemos para uma pessoa, eu queria que a parte da frente também fosse um recado. Como se mandando esse postal para alguém você estivesse enviando tanto a sua mensagem do verso quanto aquilo que eu escrevi”

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“Eu já usei antes esse formato em que escrevo uma história como se estivesse escrevendo para alguém. O Dentes de Elefante é isso, um cara escrevendo uma carta. Algumas das pessoas que mais me influenciaram dentro desse conceito são poetas, como a Matilde Campilho, que é portuguesa que morou um tempo no Brasil. Muitos poemas dela parecem exatamente isso: uma carta em que ela está se dirigindo a alguém de forma mais fluida e lírica, menos preocupada com deixar aquela pessoa consciente do que está acontecendo na sua vida e mais preocupada em deixar ela consciente de como você está se sentindo. De algum jeito você está falando sobre a sua vida, mas não se trata da pessoa entender plenamente tudo o que passou ou por onde esteve”

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“Além da Matilde Campilho, outro poeta que me influencia dentro dessa proposta é o Frank O’Hara. Eles têm isso de interessante: muitas vezes parecem que estão escrevendo para alguém, falando com alguma pessoa específica, e de uma maneira bem sincera e apaixonada”

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“É um quadrinho muito simples, não tem experimentação em relação a forma nem nada. Acho que ele me fez pensar sobre as possibilidades dos quadrinhos por ser naquele espacinho curto… É uma proposta que destaca a capacidade que os quadrinhos têm de fazer transparecer uma quantidade tão grande de informação, como eles conseguem conter tantas informações em um espaço tão pequeno e que vão chegar a alguém. Você tem imagem e texto mas eu queria fazer algo que não fosse óbvio em relação a ambos. Eu queria justamente criar uma desconexão entre as duas coisas, o que é uma das coisas mais interessantes que se tem pra fazer em quadrinhos”

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“É um espaço tão pequeno, como naquele exemplo da Rutu Modan. É justamente sobre isso, a quantidade de informação que você está dispondo em um espaço tão pequeno e de uma forma que não é necessariamente comum, sabe?”

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“O meu trabalho acaba sendo realmente uma expressão de como eu penso, uma representação de como eu penso e do que está acontecendo na minha cabeça. Tem uma porrada de informação, mas não tem muito horizonte, as informações acabam se embaralhando. O quadrinho de alguma forma reflete isso também”

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“Na época que fiz o postal… Aliás, como sempre, né? Eu estava lendo muitos escritores da geração Beat e lendo os diários de viagem do Jack Keuroac. Aí a ideia que me veio foi essa: tentar resumir uma sensação que eu tinha a respeito do que tinha sido o meu ano na forma de uma viagem, como se o meu ano tivesse sido uma viagem. Mas tudo isso em alguns poucos quadros (risos) Então me abstive completamente de tentar expressar alguma informação factual e me mantive na tentativa de sintetizar algumas sensações que atravessei”

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“Pra mim, a grande realização é quando você consegue acabar a página e percebe que aquilo que está ali é o que você conseguiu conter naquele espaço. É óbvio que jamais será tudo que aquele espaço pode conter. Inclusive acho que estamos longe de conseguir conter tudo o que é possível estar presente em uma página de quadrinho. Geralmente, quando estou tendo muita dificuldade para fazer um desenho ou uma página, é porque não tenho essa consciência. É quando não consigo fazer muito sentido. Quando você consegue entender que aquilo é um espaço limitado, melhor. No caso, eu queria realmente passar uma mensagem sincera de como estava me sentindo para alguém, e tudo o que coube de mim está ali, cifrado pra um possível interlocutor desvendar ou interpretar como quiser”

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Ramon Vitral

Meu nome é Ramon Vitral, sou jornalista e nasci em Juiz de Fora (MG). Edito o Vitralizado desde 2012 e sou autor do livro Vitralizado - HQs e o Mundo, publicado pela editora MMarte.

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