Talvez você não considere A Última Enciclopédia necessariamente uma história em quadrinhos. O próprio autor da obra, o quadrinista Rafael Sica, não a considera exatamente uma HQ, mas ele também não descarta a possibilidade de ser. O autor inclusive simpatiza com a dúvida, e a vê como um estímulo ao início de cada novo trabalho.
“O estranhamento é para mim algo fundamental”, me diz Sica, autor do álbum Meu Mundo Versus Marta, que tem roteiro do escritor Paulo Scott, e da série Ordinário. Ambos foram publicados pela editora Companhia das Letras.
A Última Enciclopédia é mais um fruto da parceria de Sica com o ateliê e estúdio de impressão em serigrafia Caderno Listrado. Juntos eles administram o site e criam os produtos da loja virtual do autor, além de já terem publicado o livro Brasil (atualmente esgotado).
Lançada mensalmente desde março de 2023, a Última Enciclopédia consiste em uma coleção de 10 gravuras de tiragem limitada. Cada volume tem um tema, todos voltados para a maior concentração possível do conhecimento humano, sempre com a arte delicada de Sica.
Os cinco primeiros volumes foram O Espaço, Planeta Terra, Fauna e Flora, Mares e Rios e A Pré-história. Entre agosto e dezembro serão publicadas: Civilização e Costumes, Nosso Corpo, As Máquinas, Ciências e Tecnologia e MItologia e Simbologia.
Sica fez muito trabalho de escola com enciclopédias e revela um carinho especial por obras do tipo voltadas para crianças: “Para criança tudo é novidade e essas edições compreendem bem essa descoberta do todo pela primeira vez. Tudo ricamente ilustrado e explicado, como, por exemplo, ‘por que temos que mastigar com cuidado?’ ou ‘por que crianças pequenas possuem cabeças grandes?’”.
Na Última Enciclopédia, Sica se propôs a celebrar, apenas com imagens, a narrativa estabelecida por ele durante suas leituras de enciclopédias, focando nas ilustrações e na hierarquização das informações. Ele ressalta não ter nenhum propósito científico ou histórico com o projeto. Seus objetivos maiores são celebrar um formato, sugerindo “contemplação e provocação”.
Ele refletiu sobre a iniciativa: “Temos todo o conhecimento disponível nas redes, só que tudo tá ali de forma mais dispersa, mais apressada. A minha intenção, como gesto artístico, é resgatar esse formato de organização e investigação do conhecimento. Esse códex”.
Nas cinco edições enviadas até agora para os assinantes da Enciclopédia, Sica ostentou todo seu virtuosismo narrativo, diversificando no design das páginas e ampliando o universo visual do projeto a cada novo volume. São cerca de duas e três semanas para desenhar cada painel após o término do período de pesquisas.
Sica me contou que a maior parte de seus estudos acabam descartados da edição final, mas não considera o trabalho em vão: “Sem dúvidas, A Última Enciclopédia vai virar um livro de umas 200 páginas. É muita coisa legal que teve de ficar de fora por conta do espaço”.