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Entrevistas / HQ

Papo com Tom Gauld, autor de Golias: “Pode ser que os quadrinhos venham da parte de mim que está feliz por estar só e mais aberta à tristeza”

O álbum Golias é o primeiro quadrinho do artista escocês Tom Gauld publicado no Brasil. Lançada por aqui pela editora Todavia, a HQ narra a história do confronto bíblico entre Davi e Golias, mas sob o ponto de vista do gigante filisteu. Eu entrevistei o quadrinista britânico sobre a criação de Golias e essa conversa virou matéria para o Segundo Caderno do jornal O Globo – que você lê clicando aqui.

Eu compartilho a seguir a íntegra desse papo com Gauld. Ele comentou o ponto de partida de Golias, o desenvolvimento de seu estilo e as inspirações por trás de Mooncop – próximo trabalho do autor a ser publicado no Brasil, também pela Todavia. Saca só:

“Eu realmente não me importo se algo é uma história em quadrinhos, um livro ilustrado, um romance ilustrado ou romance gráfico, contanto que seja interessante”

Um quadro de Golias, primeiro álbum do quadrinista Tom Gauld publicado no Brasil

Qual a memória mais antiga que você tem da presença de quadrinhos na sua vida?

Eu cresci no interior e toda semana meus pais levavam eu e o meu irmão à livraria e nos deixavam escolher qualquer livro que quiséssemos. Os únicos quadrinhos eram os livros de Asterix e Tintin, então eles se tornaram minha introdução aos quadrinhos.

Eu gostaria de saber o que são quadrinhos para você. Você tem alguma definição pessoal?

Eu costumo pensar em quadrinhos como palavras e imagens trabalhando juntas na página para construir uma narrativa. A parte “trabalhando juntas” é provavelmente o mais importante. Por exemplo, um livro que tenha apenas uma foto e algum texto em cada página, provavelmente não é uma história em quadrinhos: os dois precisam interagir. Para mim, o que faz uma boa história em quadrinhos não são desenhos bonitos ou frases elegantes, mas sim como imagens e texto trabalham juntos na página para criar uma coisa nova que é muito maior do que suas partes.

É claro que essa definição não leva em conta histórias em quadrinhos sem palavras. O que serve para mostrar que não sou capaz de definir exatamente histórias quadrinhos de maneira satisfatória. No final das contas, eu realmente não me importo se algo é uma história em quadrinhos, um livro ilustrado, um romance ilustrado ou romance gráfico, contanto que seja interessante.

Um quadro de Golias, primeiro álbum do quadrinista Tom Gauld publicado no Brasil

Como você se define profissionalmente? Você trabalha como ilustrador, cartunista e quadrinista. Vocês tem alguma palavra preferida para definir a sua atuação?

Eu fico feliz em ser chamado por qualquer um desses nomes. Eu geralmente digo que sou cartunista e ilustrador.

É muito fácil reconhecer um quadrinho feito pelo Tom Gauld. Você diria que tem um estilo pessoal? Se sim, como você poderia falar um pouco como chegou a ele?

Sim, eu reconheço que tenho um estilo de desenho identificável. Quando eu estava na escola e depois na faculdade de arte, trabalhei de muitas formas distintas, copiando artistas diferentes, tentando encontrar meu próprio estilo e me sentindo frustrado por não conseguir. Eu acho que quase todos os artistas passam por isso quando começam. Mas as coisas mudaram quando comecei a desenhar quadrinhos, no final do meu período na faculdade. Eu estava tão ocupado tentando aprender todas as novas habilidades que eu precisava para contar uma história (escrita, layouts de página, passagem de tempo, etc) que eu apenas desenhei no estilo simples que eu usava quando não estava tentando impressionar ninguém. Esse estilo simples funcionou bem para meus primeiros quadrinhos e, com algumas mudanças e evoluções, ainda é o estilo que uso agora. Então eu encontrei meu estilo quando parei de tentar encontrar um estilo.

“Eu geralmente vejo toda a idéia em pequenas versões no meu caderno de desenho antes de passar para desenhos a lápis no papel”

Quadros de Golias, primeiro álbum do quadrinista Tom Gauld publicado no Brasil

Além do estilo do seu traço também vejo alguns temas e sentimentos muito presentes no seu trabalho. Penso principalmente em solidão e melancolia. Você costuma pensar muito sobre solidão e melancolia? Você se considera solitário e melancólico?

Eu não me descreveria como um solitário, parece extremo demais, mas estou feliz em minha própria companhia, provavelmente por mais tempo que muitas outras pessoas. Da mesma forma, sinto melancolia às vezes, mas não de forma esmagadora. Eu acho que você está correto ao notar que esses temas estão presentes nos quadrinhos, mas eles estão mais presentes nos quadrinhos do que na minha vida. Eu acho que pode ser que os quadrinhos venham da parte de mim que está feliz por estar só e mais aberta à tristeza.

Você pode falar um pouco sobre os seus métodos de trabalhos e suas técnicas? Que tipo de material você geralmente utiliza? Você tem alguma rotina de trabalho?

Todos os meus trabalhos, desde ilustrações até curtas-metragens e graphic novels, começam nos meus cadernos de esboços. Eu estou sempre fazendo pequenas anotações e rabiscos e alguns deles ficam sentados por anos antes de se transformarem em uma obra de arte acabada. Eu geralmente vejo toda a idéia em pequenas versões no meu caderno de desenho antes de passar para desenhos a lápis no papel. Eu faço muitos desenhos e quando eu tenho um que funciona, eu uso uma mesa de luz para traçar os contornos básicos em um papel melhor com uma caneta Uni-Ball. Em seguida, adiciono todos os detalhes, textura e hachura na caneta e, quando termino, digitalizo no computador e adiciono a cor no photoshop.

Eu trabalho melhor no começo do dia. Algumas das minhas melhores ideias surgem na viagem de ônibus até o trabalho pela manhã e faço rabiscos em um pequeno caderno de bolso para não deixá-las escapar. Eu tento ir ao meu estúdio às 8h30 e fazer o máximo de desenho possível antes do almoço. Em um mundo perfeito, eu nem ligaria o computador até a tarde, porque é uma distração terrível. Eu normalmente fico sem energia criativa por volta das 16h, então eu resolvo alguma papelada ou emails por um tempo e volto para casa às 17:30. Às vezes, faço algumas anotações e rabiscos em meus cadernos de esboços à noite.

“Quanto mais eu pensava sobre a história, mais eu percebia que Golias é o verdadeiro azarão”

O que você pensa ao ver o seu trabalho sendo publicado em um país como o Brasil? Você fica curioso em relação à forma como seu quadrinho será lido e interpretado em uma realidade tão diferente daquela em que você vive?

Além de algumas poucas palavras de francês, eu só falo inglês, então tenho que confiar nos editores e tradutores para fazer os quadrinhos funcionarem em um novo idioma. Mas como você está sugerindo, é mais do que apenas a linguagem que muda. Estou realmente feliz por meu trabalho e o humor em particular terem encontrado uma audiência no exterior. Ambos Golias e Mooncop são inspirados por obras de arte existentes (os filmes bíblicos e de ficção científica) que são bastante universais.

Por que contar a história de Davi e Golias sob a perspectiva do Golias?

Eu gostava da ideia de pegar uma história bem conhecida e contar de outro ponto de vista. O mito de Davi e Golias me atraiu porque é dito completamente do ponto de vista de Davi. O Golias é apenas um personagem, ele é apenas um dispositivo de enredo ou uma representação do mal, de modo que deixou muitas perguntas para eu responder na minha história: Por que ele está ameaçando os israelitas? O que ele fez antes? Como ele se sente sobre isso?

Eu também achei que quanto mais eu pensava sobre a história, mais eu percebia que Golias é o verdadeiro azarão. A história não é gigante versus garoto, é gigante versus garoto e O-Todo-Poderoso-Criador-do-Universo.O Golias está condenado desde o começo, então eu não pude deixar de sentir simpatia por ele.

“Algumas coisas são ruins e outras são boas, mas são tantas, que me sinto mais confuso do que otimista ou pessimista”

Quadros de Golias, primeiro álbum do quadrinista Tom Gauld publicado no Brasil


E você poderia me falar um pouco sobre a origem de Moocop?

A idéia de um policial na lua veio de um brinquedo dos anos 1960 que encontrei, que era um carro com ‘Space Patrol’ escrito de um lado e um motorista em uma cúpula de vidro empunhando um canhão de laser. A embalagem mostrava o carro em uma lua deserta, com a terra no céu negro acima. O brinquedo sugeriu um futuro em que não apenas havíamos colonizado a lua, mas o empreendimento foi bem sucedido o suficiente para exigir uma força policial fortemente armada. A distância entre essa idéia otimista e datada do futuro e o fato de que ninguém pôs os pés na lua desde 1972 pareceu engraçada e meio trágica. Comecei a imaginar a vida de um policial solitário patrulhando a lua e a história cresceu a partir daí.

Mooncop me fez pensar bastante sobre a nossa realidade hoje e as nossas perspectivas. Você é otimista em relação ao nosso futuro?

Eu tento me manter positivo. Mas sinto que hoje as coisas estão acontecendo e mudando mais rápido do que nunca. Algumas coisas são ruins e outras são boas, mas são tantas, que me sinto mais confuso do que otimista ou pessimista.

Artes, literatura e ciência são temas muito presentes no seu trabalho. Estamos testemunhando um número cada vez maior de governos de extrema-direita nos quais artes e ciência acabam são costumeiramente atacados. Você vê algum motivo em particular para essas áreas serem vítimas habituais desses governos?

Parece que geralmente a direita política quer manter as coisas como estão ou voltar aos ‘bons e velhos tempos’. Enquanto a arte e a ciência estão frequentemente tentando coisas novas ou olhando para as coisas de uma nova maneira.

Eu acho que alguns políticos só estão interessados em coisas para as quais um valor monetário pode ser facilmente agregado, e ciência e arte são menos fáceis de serem valorizadas assim.

Um quadro de Golias, primeiro álbum do quadrinista Tom Gauld publicado no Brasil

Você está produzido algum projeto novo no momento?

Eu estou trabalho em dois livros no momento. Um é uma coletânea de cartuns sobre ciência e o outro é um livro ilustrado para crianças.

A última! Você poderia recomendar algo que esteja lendo, assistindo ou ouvindo no momento?

Gostei muito da nova graphic novel do Jon McNaught, Kingdom, que fala sobre a vida comum e mundana de uma forma muito bonita e interessante.

Eu ouço muito rádio e podcasts enquanto desenho e particularmente gosto de In Our Time da BBC que analisa um tópico diferente da história, da ciência e das artes a cada semana. Três especialistas falam sobre o assunto, mas o anfitrião é brilhante em fazê-los explicar as coisas em termos que alguém como eu possa entender.

A capa de Golias, primeiro álbum do quadrinista Tom Gauld publicado no Brasil
HQ / Matérias

Tom Gauld fala sobre Golias, solidão, melancolia e policiais lunares

Você provavelmente já esbarrou por aí com uma capa de revista ou uma tira assinada pelo quadrinista escocês Tom Gauld. A popularidade do autor é fruto principalmente dos quadrinhos e artes que ele assina em publicações como as revistas New Yorker e New Scientist e o jornal The Guardian. No entanto, nenhum dos álbuns dele havia sido publicado no Brasil até a editora Todavia lançar Golias.

A HQ de 96 páginas recém-chegada às livrarias brasileiras apresenta a história bíblica de Davi e Golias, mas sob o ponto de vista do gigante filisteu. Eu entrevistei Gauld sobre a obra e essa conversa virou matéria pro Segundo Caderno de hoje do jornal O Globo. No texto eu apresento falas de Gauld tratando do ponto de partida da história, a relação dele com solidão e melancolia e Mooncop – próxima HQ do autor a ser publicada pela Todavia. Você lê o meu texto clicando aqui.

Um quadro de Golias, primeiro álbum do quadrinista Tom Gauld publicado no Brasil
Entrevistas / HQ

Papo com Jeff Smith, o autor de Bone: “A filosofia de Peanuts, os estilos de Carl Barks e de Walt Kelly, a humanidade de Krazy Kat são o que me trouxe aos quadrinhos”

Entrevistei o quadrinista Jeff Smith, autor do clássico Bone, sobre o lançamento do primeiro volume da versão em cores da série no Brasil. A obra rendeu dez prêmios Eisner e 11 Harvey ao autor e fez dele um dos grandes nomes dos quadrinhos mundiais. A promessa da editora Todavia é que as duas coletâneas que fecham a coleção sejam lançadas no país até o final de 2019. Transformei a minha conversa com o artista em matéria para o jornal Folha de São Paulo e você confere o meu texto clicando aqui – recomendo a leitura da matéria para que você compreenda um pouco mais da jornada de Smith e Bone até o lançamento dessa edição brasileira.

Reproduzo a seguir a íntegra da minha entrevista com Jeff Smith. Na nossa conversa ele falou sobre as origens dos primos Bone ainda na sua infância, comentou as principais influências de sua formação como artista, abordou os desafios de manter uma série independente de 55 edições ao longo de 13 anos e adiantou um pouco sobre seu próximo projeto. A entrevista foi traduzida pelo jornalista, crítico, pesquisador e tradutor Érico Assis (valeu pela ajuda, Érico!). Papo massa, saca só:

“Era fim dos anos 1970. Tolkien, Moebius e, óbvio, Star Wars. Foi chute e gol. Logo eu me dei conta que preferia cultura pop a artes plásticas”

Qual a memória mais antiga que você tem da presença de quadrinhos na sua vida? Eu li que os seus pais eram leitores de quadrinhos, correto?

Meu pai gostava da Mad e lia ela pra mim quando eu era pequeno. Eu amava os desenhos, principalmente Spy v. Spy e os cartuns do Don Martin. Lembro de aprender a ler sozinho com um livrinho de tiras dos Peanuts. Ainda tenho esse livrinho!

Também li que você começou a criar os personagens e o universo de Bone quando era muito jovem. Qual foi o momento em que você decidiu transformar todos esses conceitos em uma série? Você lembra do instante em que decidiu explorar o mundo de Bone?

Lembro, sim. Depois do ensino médio, quando entrei na universidade, os Bones foram parar na mesma caixa das coisas de criança. Estudei artes plásticas, mas na época tinha uma onda de fantasia na cultura pop. Era fim dos anos 1970. Tolkien, Moebius e, óbvio, Star Wars. Foi chute e gol. Logo eu me dei conta que preferia cultura pop a artes plásticas. Em 1979, desenterrei os três primos Bone e comecei a trabalhar com essa ideia de como eles podiam se encaixar em um mundo vasto e de fantasia.

“Eu sabia que personagem de cartum tinha quatro dedos, nariz gigante e pé gigante, então desenhei assim”

Por que Bones? Em termos de fantasia estamos muito mais acostumados com criaturas como elfos, trolls e hobbits, conceitos de certa forma muito mais identificáveis e acessíveis para os leitores, você não acha?

Era o que eu tinha na mão. Eles eram meus! Como você mesmo lembrou, eu inventei os três quando tinha uns cinco anos. Eu sabia que personagem de cartum tinha quatro dedos, nariz gigante e pé gigante, então desenhei assim. E eles parecem ossinhos [bones]! O importante era eles terem personalidade. Já estavam lá, nos gibis toscos que eu fiz quando era criança, o carinha normal, o avarento e o pateta.

No final das contas, Bone é uma história com início, meio e fim em mais de 1400 páginas de quadrinhos, desenvolvidas por você ao longo de mais de 13 anos. O quanto da história você já tinha definida quando começou a publicar a série? O quanto você já sabia dos rumos e do fim da história quando ela teve início?

Minha primeira rodada com o Bone impresso foi uma tira diária no jornal da faculdade. Acho que eu recebia sete dólares por tira. Foi o que eu fiz, cinco dias por semana, durante quatro anos. Como eu tive esse tempo todo, consegui errar bastante e aprender o ofício, mas também brotaram umas coisas que eu ia usar depois. Fone Bone gamado na menina da fazenda, a Espinho. A misteriosa relação entre Vovó Ben e o Dragão Vermelho. A jornada de Fone Bone e Smiley Bone às montanhas para devolver o filhote perdido. O primeiro encontro com Queixo Duro, o leão gigante, e aquela figura meio Morte que mandava nas Ratazanas; tudo virou baliza no épico que depois eu tracei pra revista. O que aconteceu com a tira foi que, como toda tira, ela não tinha fim. Era uma série infinita de piadinhas e aventuras. Eu queria uma trama de verdade, e tramas têm fim. Quando eu inventei o final, consegui usar esses pontos de parada pra criar uma trama, no que eu esperava que virasse uma série em quadrinhos épica.

“Quando eu inventei o final, consegui usar esses pontos de parada pra criar uma trama, no que eu esperava que virasse uma série em quadrinhos épica.”

Ainda sobre Bone ser essa imensa saga de 1400 páginas: você tinha consciência da etapa da história em que você se encontrava enquanto desenvolvia o quadrinho?

Tinha, sim. Tinha que ter. Estava sempre ciente da narrativa, mas às vezes me perdia na selva. Eu tinha o hábito muito ruim de fugir no roteiro quando surgia uma coisa engraçada. Humor é um ímã, no meu caso. Talvez me dê mais trabalho pra voltar à trama, mas vale a pena expandir. Eu tinha uns arquivos e anotações para não sair muito da linha, em todo caso.

Você pensa sobre as experiências distintas entre ler Bone como foi lançado originalmente e nessas coletâneas imensas? O que você acha que alguém que nunca leu Bone pode ganhar tendo acesso à sua história pela primeira vez nessas edições gigantescas?

Se estes volumes mais recentes, e lindos, são seu primeiro contato com Bone, você vai sentir toda a textura e ritmo da trama, a jornada, como um romance ou um filme. Os leitores originais de Bone tiveram a experiência seriada, de uma série em quadrinhos que saía mais ou menos de dois em dois meses. Durante treze anos, cada edição tinha que se sustentar por si só e fazer o leitor voltar pedindo mais. Tenha em mente que, naquela época, a ideia de histórias mais compridas, ou graphic novels, ainda estava no início. Não sei se alguém notou que as aventuras dos Bone estavam se armando para uma conclusão até chegarmos bem pertinho do final! Claro que eu sabia, e por isso que, mais ou menos uma vez por ano, Vijaya e eu republicávamos os gibis em livro, para os novos leitores ficarem em dia. Eram os nove volumes que você precisava ler. Em preto e branco.

Edições em preto e branco são muito mais baratas do que coloridas, ainda mais no caso se publicações independentes, como era o seu caso quando começou com Bone. Quais são os benefícios para a história do preto e branco original do seu trabalho?

Eu gosto de gibi em preto e branco. Os gibis originais de Bone, a série, eram em preto e branco. Isso em parte porque eu não tinha dinheiro pra pagar por cores, mas também porque as tiras que eu adorava, como Peanuts e Dick Tracy, eram em preto e branco. Mas não há como discutir que as versões coloridas fazem mais sucesso.

Você poderia falar um pouco sobre a sua decisão de colorir Bone? Você sempre teve em mente a possibilidade de lançar uma versão colorida?

A decisão de colorir foi, em parte, pragmática e, em parte, inspiração. Pragmática porque a maior editora de livros infantis do mundo, a Scholastic, nos procurou e queria lançar um selo de graphic novels com Bone. Uma das maneiras de renovar a história era colorir. No início eu hesitei, mas fui buscar conselhos com um dos meus ídolos, Art Spiegelman, criador da biografia gráfica Maus. Foi o Art quem me incentivou a colorir. Quando eu perguntei por quê – já que Maus, uma das inspirações para eu investir nos quadrinhos como minha arte, é em preto e branco – ele respondeu o seguinte: ‘Maus trata da guerra e devia ser em preto & branco, mas Bone trata da vida e só vai estar acabada quando estiver colorida.’

“Não sei se alguém notou que as aventuras dos Bone estavam se armando para uma conclusão até chegarmos bem pertinho do final”

Eu li uma resenha famosa de Bone, publicada pela revista Time, que diz que a série é ‘a melhor graphic novel para todas as idades já publicada’. Você tinha um público específico em mente quando começou a produzir Bone? Quais foram as suas impressões quando Bone começou a ser lida tanto por adultos quanto por crianças?

Fiquei surpreso. Quando eu lancei Bone, havia pouquíssimas crianças comprando ou lendo revistas em quadrinhos nos EUA. Isso mudou aos poucos. As graphic novels e o mangá ajudaram. Talvez eu nem devesse me surpreender, já que me esforcei para criar o gibi que eu queria ler quando criança! Hoje em dia, quando eu faço sessões de autógrafos, a fila tem adultos e crianças misturados.

Eu li várias entrevistas nas quais você fala sobre a influência de tiras de jornais na sua formação. Você poderia falar um pouco como essa influência se fez presente em Bone?

No timing do humor, quem sabe? A filosofia de Peanuts, os estilos de Carl Barks e de Walt Kelly, a humanidade de Krazy Kat são o que me trouxe aos quadrinhos. Ao mesmo tempo, são o que me prendem na prancheta.

“Quando alguém pergunta no que você trabalha, você diz ‘Eu desenho quadrinhos’ e respondem: ‘Massa! Que interessante!’ Isso não acontecia, sabe?”

Bone foi publicado pela primeira vez nos anos 90 e quase 30 anos depois nós ainda estamos aqui falando sobre essa série. O quanto você acha que o mundo dos quadrinhos mudou desde o começo da sua carreira?

Ih, cara. Tanta coisa. Tem resenhas de quadrinhos em jornais e revistas. Os gibis voltaram às mãos de milhões de crianças, você compra gibis onde tiver livros, música ou filmes. Hoje todos os filmes são de super-heróis. Quando alguém pergunta no que você trabalha, você diz ‘Eu desenho quadrinhos’ e respondem: ‘Massa! Que interessante!’ Isso não acontecia, sabe?

O que são quadrinhos para você, hoje?

Não sei uma definição específica, mas sei quando funciona. Quando uma série de imagens com palavras e figuras começa a se mexer, a transmitir tempo e espaço, aquilo ganha vida. Quando isso acontece, o leitor embarca na viagem.

Qual é o seu próximo trabalho? Você está desenvolvendo algum projeto novo no momento?

Estou trabalhando em um projeto chamado Tuki and the Dinga. É a reformulação de um projeto que eu larguei há uns anos e agora quero retomar. Ele se passa na aurora da nossa espécie, há dois milhões de anos.

A última! Você poderia recomendar algo que tenha lido, visto ou ouvido recentemente?

Recomendo tudo que foi escrito ou desenhado pelos fabulosos irmãos Bá e Moon. Atualmente estou lendo Macanudo, do argentino Liniers, e tenho uma compilação de discos ao vivo do Tom Petty em looping perpétuo. Agora eu vou fazer um sanduíche. Obrigado mais uma vez pela atenção! Tudo de bom!

Entrevistas / HQ

Papo com Luli Penna, autora de Sem Dó: “O que mais me impressionou foi a diferença entre a liberdade sexual dos homens e das mulheres, brutal naquela época (e hoje)”

A quadrinista Luli Penna pretendia contar em quadrinhos a história da vinda de seu avô e do seu tio-avô espanhóis para o Brasil. Ela já havia desenhado a saída dos dois da Europa e estava trabalhando na travessia do Oceano Atlântico quando mudou de ideia. O foco do projeto então passou a estar em suas tias e o cenário passou a ser a São Paulo dos anos 20. Sem Dó trata do despertar de um romance em uma cidade em transformação, contrapondo os costumes conservadores da época com a modernização da capital paulista.

Impressiona no trabalho de Luli Penna principalmente seu pano de fundo. A ambientação do álbum é aprofundada com ilustrações retratando a arquitetura art decó de São Paulo na década de 20 e com reproduções de anúncios publicitários e textos jornalísticos da época. “Quando comecei o Sem Dó já colecionava livros sobre a história de São Paulo, obras com fotos antigas e cartões postais. Durante o trabalho a coisa foi só aumentando”, conta a autora em entrevista ao blog.

Sem Dó é o quadrinho de estreia da autora e primeira HQ nacional da editora Todavia. A obra será lançada amanhã (31/10), às 19h30, na Livraria da Vila (R. Fradique Coutinho, 915) em São Paulo. Recomendo o livro pela relevância dos temas abordados por Luli Penna e pela beleza de sua arte. Na entrevista a seguir, ela fala sobre a origem do projeto, a construção da HQ e sobre alguns dos tópicos abordados no quadrinho. O papo contém alguns spoilers da obra, então acho melhor guardar a entrevista pra depois da leitura da HQ, combinado? Segue a conversa:

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Você se lembra do instante em que teve a ideia de criar o Sem Dó? Qual é a origem do livro?

Eu estava desenhando a história do meu avô e do meu tio-avô, filhos de um pai anarquista radical que migrou para o Brasil no finalzinho do século XIX. Já tinha desenhado a vinda da família da Espanha pra cá, a travessia do Atlântico, mas estava ainda com o roteiro muito à deriva. Nesse meio tempo, continuava pesquisando, lendo sobre a época e principalmente conversando com parentes sobre a vida no Brás do começo do século passado, o dia-a-dia, etc. Numa dessas conversas, ouvi a história das irmãs dos dois. Aí pensei, “para tudo, não quero falar dos homens famosos da família (meu avô e meu tio avô se tornaram arquitetos importantes nos anos 50), quero falar dessas duas tias obscuras”!

O que mais me impressionou na história delas, não dá pra falar muito claramente sobre isso porque estragaria a leitura da HQ, é a diferença entre a liberdade sexual dos homens e das mulheres, brutal naquela época (e hoje). Há um elemento na história que é o exemplo máximo dessa disparidade: o dispositivo, digamos assim, que facilita a vida de prazeres dos homens é exatamente o mesmo que põe fim aos prazeres das mulheres. Foi exatamente quando essa prima dos meus avós me falou sobre isso que decidi desenhar o Sem Dó. Não ficou claro, né? É que, se eu disser exatamente do que se trata, entrego demais a história

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Me chamou muito a atenção seu trabalho para retratar a São Paulo do início do século XX. Em relação à arquitetura da época, que tipo de pesquisa você fez pra chegar a essa ambientação da obra?

Quando comecei o Sem Dó já colecionava livros sobre a história de São Paulo, livros de fotos antigas e cartões postais. Durante o trabalho a coisa foi só aumentando. Comprei muita coisa, emprestei, consultei muitos sites, andei muito pelo centro velho. E usei vários fotogramas de filmes mudos. O Limite, do Mårio Peixoto, por exemplo, um filme mudo brasileiro absolutamente maravilhoso lançado em 1931, eu vi muito. Vários quadrinhos foram copiados de lá (o retrós que a Lola usa enquanto costura, os sapatinhos dela saindo de casa e a própria idéia de passar um filme dentro da história foram coisas que eu copiei do Limite).

Não há nenhuma referência no Sem Dó à data exata em que se passa a história, mas tentei me concentrar no final da década de 20 para a pesquisa, nas revistas e no ano de 1927 para a pesquisa nos jornais. Mas dei umas roubadas… Há um anúncio de bonde dos anos 40, há vitrines anteriores à década de 20, enfim. Procurei me nortear por algumas datas específicas mas não me furtei a pegar coisas de outros carnavais.

“Esse mundo impresso era um luxo das elites, como, aliás, continua sendo. Imagina o número de pessoas que têm dinheiro pra comprar um álbum de HQ hoje no país…”

E sobre os anúncios publicitários e as matérias de jornais da época? Você trabalhou com alguma bibliografia específica?

Sempre gostei de folhear revistas antigas, Tenho uma coleção que herdei justamente de uma das tias avós em que se baseia o Sem Dó. Além disso, tive a sorte de começar a HQ num momento em que muita coisa já estava disponível na internet. A [revista] Scena Muda, boa parte das [revistas] ParaTodos, Cigarras, América estão disponíveis em vários sites. Isso facilitou muito a pesquisa. Digo o mesmo em relação aos jornais.

Mas, como os protagonistas do Sem Dó são duros, eles estão sempre espiando esses anúncios e matérias na publicação do passageiro ao lado, no trem ou no bonde. No caso da Lola, ela ganha do patrão uma pilha de revistas enorme, que ela e a mãe não se cansam de folhear. Esse mundo impresso era um luxo das elites, como, aliás, continua sendo. Imagina o número de pessoas que têm dinheiro pra comprar um álbum de HQ hoje no país…

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Aliás, é interessante não apenas seu cuidado em relação à arquitetura, às vestimentas e aos anúncios publicitários, mas também no que diz respeito à postura das pessoas. As interações dos protagonistas são marcadas por muitas sutilezas, como troca de olhares, decorrentes de imposições sociais da época. Foi desafiador pra você pensar com a perspectiva dessa época?

Isso tudo foi feito com base em histórias que ouvi. A cena da Lola, por exemplo, correndo pra janela do quarto ao chegar em casa pra ver o paquera com quem ela acabou de trocar olhares no bonde. Essa cena se passa exatamente como minha avó me contou que eram os namoros da época. Troca de olhares na rua; homem segue mulher pela cidade até descobrir onde ela mora; homem fica andando de um lado ao outro da calçada; homem tira o chapéu pra mulher quando passa embaixo do lampião… Hoje em dia, primeiro você dá um match no Tinder, depois sai pra rua. Lá naquela época, conhecer o cara, dar uma olhada pra ver se rola o match e todo o processo da paquera, envolvia as ruas da cidade.

Hoje as pessoas saem de suas garagens, vão até a garagem de um shopping, fazem compras, passeiam e voltam pra casa sem se relacionar com as ruas. Lá naquela época, as coisas aconteciam muito mais nas ruas, embora já estivesse previsto ali naquela São Paulo antiga esse império do automóvel. Na cena em que eles vão ao cinema Santa Helena, há um quadrinho em que aparece a Praça da Sé com metade da catedral construída e a praça toda tomada por carros estacionados. A praça era um estacionamento! Embora o Santa Helena seja hoje a estação do metrô e a praça um calçadão, sabemos como os pedestres são maltratados nessa cidade de carros. Por isso também que eu pensei no contraponto Estação da Luz-Rodoviária antiga. São Paulo começando no trem e acabando na rodoviária, no congestionamento total.

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Eu fiquei curioso em relação à construção do quadrinho. Você não trabalha com um gride fixo e insere páginas de jornais e anúncios publicitários durante a HQ. Você trabalhou com um roteiro?

Minha primeira ideia foi contar simultaneamente a história do Sebastião nas páginas esquerdas e a da Lola nas páginas direitas… Fiz isso durante um tempo, mas felizmente parei a tempo de não ser internada. Daí voltei prum grid que eu queria que fosse fixo o tempo todo pra dar mais a impressão de filme mudo. Mas as poucas pessoas pra quem mostrei os desenhos iniciais foram unânimes num comentário: “não é melhor dar uma variada nisso aí, não?” Daí, comecei a variar e achei legal, tomei gosto pela coisa.

Quanto ao roteiro, já comecei a desenhar com ele pronto. Tinha muitas dúvidas sobre o final, mas o grosso do roteiro estava definido desde o início. Mesmo porque, o enredo do Sem Dó é muito simples. O que mudou muito, o tempo todo, em todas as páginas, foi a sequência dos quadrinhos, os enquadramentos, etc. Se o livro tiver três páginas que foram esboçadas da maneira em que foram impressas, é muito. Assim que finalizava uma página e a via lá, prontinha, toda caprichada no nanquim, recortava tudo, mudava os quadrinhos de lugar, refazia, inseria um anúncio, remontava tudo de novo. Posso dizer que o material utilizado foi papel, nanquim e tesoura.

Nesse processo, os anúncios foram uma parte importante tanto da composição da página quanto do sentido da história, mesmo que ninguém perceba. No início, na cena do trem ainda, por exemplo, a primeira leva de anúncios que o Sebastião vê no jornal do passageiro ao lado, funciona como um resumo da história toda que está por vir. Ninguém nunca vai pensar nisso, mas foi assim que eu escolhi cada um deles. No final, cada anúncio que aparece faz um contraponto com os anúncios iniciais, etc. Mas isso é viagem minha, é como um prazer secreto de fazer algo que só a gente sabe.

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No começo do quadrinho, na cena da chegada do trem, você desenhou algumas formas circulares sobrepostas. É uma solução gráfica singular, pra mim representa tanto o som quanto a fumaça do trem. Você pode falar um pouco de como chegou nesses símbolos?

Que legal que você achou isso! Essa cena é um bom exemplo de como é possível fazer uma coisa muito legal sem virtuosismo. Fiz mil esboços desses quadrinhos tentando desenhar a fumaça do trem chegando à estação. Não conseguia uma fumaça legal de jeito nenhum até que, rasbiscando distraída no papel, comecei a desenhar esses arcos que são típicos da arquitetura e do mobiliário art deco da época e PLIMMM!!! Achei que aquilo parecia fumaça e, ao mesmo tempo, as engrenagens do trem, o que dava justamente essa impressão daquela máquina enorme se aproximando. Não pensei exatamente no barulho mas no funcionamento das engrenagens. Amei que você ouviu o barulho delas…

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O quadrinho é ambientado na época em que o cinema estava surgindo. Há uma cena com a protagonista utilizando um praxinoscópio e a chegada do trem me remete a um diálogo com o filme dos irmãos Lumière. A sua opção por não fazer uso de balões e colocar os diálogos em quadros pretos semelhantes às telas de filmes mudos do início do século passado também são uma referência às origens do cinema?

Sim! O Sem Dó se passa exatamente nessa época em que o cinema ainda era uma novidade, um espetáculo grandioso. Era imenso o prazer que as pessoas sentiam ao ver as imagens se movimentando, não só no cinema mas na grande variedade de engenhocas ópticas da época. Por isso me demorei tanto na cena em que a Lola faz uma pausa no trabalho para girar um zootrópico (o praxinoscópio é derivado dele. O zootrópico tem fendas na roda giratória, por onde o espectador vê as imagens que parecem se movimentar. O praxinoscópio – adoro esses nomes esdrúxulos – tem espelhos no eixo central que refletem as imagens da roda giratória). O prazer de desenhar uma HQ e tentar colocar as personagens em movimento é muito parecido com esse prazer de girar um zootrópico da Lola. Acho que esses brinquedos ópticos que aparecem no livro, a ida ao cinema do casal e a cena em que eles vão fazer um retrato no Parque da Luz (esse momento da captura da imagem) falam muito não só da época mas do trabalho todo de fazer uma HQ.

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Nós estamos vivendo um período de conservadorismo crescente. As últimas páginas do quadrinho apontam para um período de mudança que soa de alguma forma mais otimista e progressista. Como você vê o nosso futuro?

Nosso futuro? Torpe e melancólico.

Essas últimas páginas não estavam previstas. Passei muitos anos fazendo essa HQ. Quando comecei, o país ainda não tinha levado a surra do 7×1, não tinha sofrido um golpe, não estava descendo esse poço fundo. Quando fui chegando ao final da HQ, que ainda só se passava no começo do século passado, o país já estava mergulhado nessa depressão e eu achei que, mesmo com o final nada feliz da protagonista, havia uma sensação de resistência ali, uma sensação de nostalgia de uma cidade antiga e linda etc. Comecei a achar que seria mais interessante dar uma nota menos redentora, menos grandiosa pra coisa, e comecei a pensar num final mais melancólico, mais torpe. Foi aí que comecei essa espécie de posfácio nos anos 70, tentando um paralelo com o começo: Estação da Luz/Rodoviária velha; gramofone/gravador cassete; luvas de pelica/mini-saia; cotação do café/projetos desenvolvimentistas na Amazônia.

Nessa seleção de anúncios, o mais importante pra mim é o anúncio final, em que se lê: “CHEGA DE LENDAS! VAMOS FATURAR!”. Quando encontrei esse anúncio da SUDAM oferecendo empréstimos para quem quisesse explorar a Amazônia com esse slogan infame, pensei: taí o final. Era como se essas cenas dos anos 70 nos mostrassem o beco em que a gente já estava se metendo lá atrás naquela São Paulo antiga. Na verdade, tudo que estou falando é uma simples cena em que a Pilar guarda em cima do armário a caixa de onde veio tirando fotos e cartões postais, vai até a rodoviária antiga e pega um ônibus. É muita viagem minha achar que, com essa meia dúzia de anúncios que ela vê no trajeto, eu tenha conseguido falar tudo isso. Mas foi o que eu pensei. Em todo caso, é por isso que o quadrinho final é aquela cena da cidade de São Paulo inteiramente congestionada e sem-saída.

Ainda sobre o desencantamento do final, há algo mais além dos anúncios e do engarrafamento final. Há também o fato de que a grande heroína não consegue seguir adiante mas a irmã acuada, sem graça e meio torpe consegue. Isso tudo acaba desembocando nesse final que não tem nada de redentor nem de empoderador, mas que me pareceu um boa maneira de falar da nossa própria torpeza geral. No fim, quando finalmente descobrimos que Pilar é a narradora e que ela resistiu a tudo, fica um gosto meio ruim na boca de ver uma resistência que se dá não pela coragem mas, ao contrário, pela conformação e por pequenos gestos nada heróicos (refiro-me por exemplo ao fato de ela entregar a foto da irmã com o namorado para os pais). Acho que nos falta esse reconhecimento de que, afinal, tanto de um ponto de vista geral de projeto da nação quanto de um ponto de vista mais microscópico, estamos todos meio envolvidos na grade torpeza geral.

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