Está aberta até o dia 22 de abril a chamada para quadrinhos da 17ª edição da revista Café Espacial. Criada em 2007 pelo editor Sergio Chaves e pela jornalista Lídia Basoli, a revista é uma das publicações independentes de quadrinhos mais tradicionais do país. Você confere as informações para envio de HQs para publicação nesse próximo número clicando aqui, mas não tem mistério: a temática é livre, o quadrinho deve ser em preto e branco no formato 14 X 21 cm (ou proporcional) e ter até 13 páginas.
“O cenário independente no Brasil evoluiu bastante nos últimos anos, mas pensar qualquer produção artística e cultural hoje em dia se tornou um grande desafio”, diz Sergio Chaves em relação aos esforços para a continuidade da publicação em meio à crise que cerca o mercado editorial brasileiro e o reacionarismo crescente no país.
Bati um papo rápido por email com o editor da Café Espacial sobre as expectativas dele pra esse próximo número. Sergio Chaves falou sobre a decisão de retomar a revista após pouco mais de um ano de hiato, o desafio de escolher as obras que serão impressas na publicação e a linha editorial da Café Espacial. Papo massa, saca só:
Por que começar agora a trabalhar na 17ª edição da Café Espacial? Como você define a data de lançamento de cada edição?
Queria ter feito isso muito tempo atrás, na verdade. Desde o lançamento da revista 16 (final de 2016, início de 2017) muitos fatores contribuíram para faltasse fôlego para pensar uma nova edição. Mas, diante de tantos retrocessos, a vontade de continuar produzindo falou mais alto.
Todas as ações da Café Espacial são realizadas de forma independente, às vezes à margem e, muitas vezes, na contramão do mercado. Por isso mesmo, a revista é aperiódica, já que seu cronograma é definido conforme as vendas do nosso catálogo e, sempre que necessário, a possibilidade autoinvestimento. Apesar da incógnita que atravessamos neste ano, nosso plano é lançar a revista 17 e mais publicações sob o selo Café Espacial a partir do segundo semestre.
Como é o processo de seleção das obras que acabam impressas na revista?
É sempre desafiador. Como a proposta da revista é reunir trabalhos autorais de diversas áreas além dos quadrinhos, a seleção depende diretamente da sinergia entre os trabalhos disponíveis. E a decisão de não determinar um tema nos permite experimentar caminhos muito além do que tínhamos imaginado inicialmente.
Contamos com muitos colaboradores acessíveis para projetarmos um novo número, mas habitualmente abrimos espaço para novos autores para estimular novos olhares e abordagens na publicação.
Muitas vezes, excelentes trabalhos ficam de fora justamente por não se encaixarem junto à seleção. Quando isso acontece, já começamos a desejar a edição seguinte.
Você consegue sintetizar a linha editorial da revista após esses 16 números ou padrão temático nos quadrinhos publicados nela?
É algo que não procuro delimitar muito. A essência da Café Espacial sempre foi o autoral, e o fato das edições nunca serem tematizadas contribuiu muito para isso.
Entendo quem tente ou que sinta a necessidade de apontar um padrão na revista, mas de minha parte, considero mais importante manter o olhar aberto para novas possibilidades dentro da publicação.
Qual você acredita ser o papel potencial de uma revista independente de história em quadrinhos em meio à chegada ao poder de um governo de extrema-direita que acabou com o Ministério da Cultura e que promete cortes em políticas públicas e sociais de fomento às artes?
Tudo o que o governo tem praticado tem sido coerente com o seu discurso de campanha. Vivemos um período em que a desonestidade e a desinformação predominam. As últimas eleições deixaram isso muito claro. O problema não está na divergência política ou religiosa, já que muitas atrocidades são justificadas em nome de Deus. O problema está na pessoa bradando contra algo por pura ignorância ou má fé mesmo. Muitos votaram por afinidade de ódio e de mediocridade, com seus preconceitos validados no discurso do candidato que elegeram. Agora, todos sofremos com as consequências drásticas em todos os âmbitos.
O cenário independente no Brasil evoluiu bastante nos últimos anos, mas pensar qualquer produção artística e cultural hoje em dia se tornou um grande desafio. Mas a luta é essa. Se deixarmos de enxergar sentido na produção artística e cultural, daí sim será a verdadeira derrota para esse governo absurdo. O que me move continuar produzindo é justamente fortalecer a oposição ao obscurantismo cada vez mais escancarado.
Talvez o papel basilar de uma revista independente seja o de instigar seus leitores a fugir do comodismo e a refletir sobre o mundo a partir de diversos pontos de vista e linguagens.
Antes de qualquer coisa, publicar de forma independente é acreditar. Acredito na transformação por meio da arte. E vejo na Café Espacial uma das melhores formas de expressar isso. Para mim, é uma forma de resistência.
Quais são as suas expectativas em relação a esse 17º número da Café Espacial?
A nova revista ainda está ganhando forma, mas já estamos trabalhando para que seja a retomada de algo maior e que alcance um público mais amplo. Em outras palavras, as expectativas são as melhores possíveis, como sempre.