O quadrinista Galvão Bertazzi assina a arte de aniversário de nove anos do Vitralizado. Bertazzi é autor das tiras das séries Vida Besta (reunida recentemente em coletânea da editora Pé-de-Cabra) e Um Ano Inteiro, do infantil Olivia Foi Pra Lua e de quadrinhos como Manual Prático da Complexidade Adquirida e Le Monstre (Ugrito #13). As artes prévias de aniversário do blog, produzidas a partir do quinto ano, foram assinadas por Jairo Rodrigues, Shiko, Benson Chin, Giovanna Cianelli e Deborah Salles.
Fiz a encomenda do cartaz para Bertazzi tendo em vista a Chamada Serigráfica, projeto do ateliê/editora Caderno Listrado voltado para a impressão de 365 obras em serigrafia. A obra foi impressa no formato A3, com três cores. Você pode comprar uma cópia do cartaz, numerada e autografada por Bertazzi, no site dele, clicando aqui.
Bati um papo com Bertazzi para saber mais sobre o desenvolvimento do cartaz celebrando os nove anos do blog. Ele me falou sobre alguns padrões recentes dos trabalhos dele que se fazem presentes na arte de aniversário do Vitralizado, comentou sua abordagem para ilustrações impressas em serigrafia e também expôs sua avaliação sobre o que considera essencial para um bom cartaz. Papo massa, saca só:
“A primeira coisa que me veio na cabeça foi: plantas!”
Logo quando começamos a conversar sobre esse cartaz do Vitralizado você já falou que estava pensando em algo relacionado à “temática plantas” em que tem trabalhado. Você pode falar, por favor, um pouco sobre essa tema predominante nos seus trabalhos mais recentes?
Durante anos eu tenho desenhado e pintado temas urbanos. É comum em quase todos os meus trabalhos a presença de prédios, carros, placas de sinalização e propaganda, fumaça e fogo e destruição em meio a janelas de prédios, muros e toda miscelânea de elementos de um centro urbano. Num dado momento, em alguma tira (não me lembro qual) brotou um ramo de folhas em algum canto do desenho, como esses matinhos que insistem em nascer no meio do asfalto. Me apaixonei por aquilo e me apropriei dessa ideia, deixando com que as plantas tomassem conta da minha produção num determinado período, especialmente nas telas que eu vinha pintando. Foi um processo legal de transmutação dos temas no meu trabalho e quando voce me convidou pra fazer a arte do cartaz, não tive dúvidas e a primeira coisa que me veio na cabeça foi: plantas!
Você fez um trabalho com o pessoal do ateliê Caderno Listrado no ano passado e eu também imprimi o cartaz do aniversário do ano passado com eles. Não foi muito difícil a nossa decisão de irmos com eles nessa nossa parceria. O que mais te interessa na impressão serigráfica? Qual você considera a maior contribuição desse tipo de impressão para o seu trabalho?
Acho que o mais importante numa serigrafia é que a coisa fique bonita, aliás, que fique algo INCRÍVEL! É muito trabalho envolvido, desde a concepção até a impressão pra que a coisa fique mais ou menos. Numa serigrafia, é comum se ter um número pequeno de cores, então pra mim a primeira coisa a se pensar é a paleta e a combinação perfeita (ou quase) dessas cores. E existe toda uma arte na coisa de se revelar uma tela, e depois na impressão um encaixe perfeito de cada uma delas. O Caderno Listrado faz tudo isso com uma maestria e paixão por todo o processo que nem passaria na minha cabeça em fazer uma impressão serigráfica se não com eles.
“Convido o observador a ‘perder um tempo’ procurando detalhes e absorvendo a mensagem depois de um tempo namorando o cartaz”
E você pode falar, por favor, um pouco sobre as cores que optou para o cartaz do blog? Nós escolhemos trabalhar com três cores, como você chegou nas três que acabou usando?
Na verdade são quatro cores, se contar com a cor do papel, que também faz parte da composição da arte. Eu tenho costume de trabalhar com paletas quentes, vermelho, laranja e amarelo. Gosto das referências: sangue, fogo, apavoro e fim do mundo. Porém, para a arte do Vitralizado eu queria algo mais sereno e menos agressivo. Aí eu optei por explorar um pouco uma coisa mais fria e “tranquila”: a ideia de uma garota apreciando um gibi, enquanto plantas florescem do livro, ao seu redor e das várias cabeças arrancados e que agora são vasos espalhados pela sala. Trabalhar com cores frias é sempre um desafio pra mim, parece que minha cabeça não funciona muito bem com essa gama de cores ( azul, verde, lilás, etc), então me toma muito mais tempo pensar em como resolver o desenho do que seria fazer algo no automático com vermelho e laranja. E geralmente, quando me aventuro nesses tons mais calmos acabo gostando muito do resultado, apesar de quase sempre ficar bem mais exausto mentalmente.
Na arte que fiz pro Vitralizado o vermelho ainda marca presença, mas está diluído numa massa turquesa e ambas se fundem aqui e acolá.
Já vi outros trabalhos seus para cartazes e pôsteres. Você gosta de projetos do tipo? O que você considera essencial em um bom cartaz? Como foi a experiência de desenvolver esse cartaz de aniversário do Vitralizado?
Acho que a principal função de um cartaz é comunicar, no sentido mais direto da coisa. Morro de inveja de quem consegue fazer um puta cartaz com poucas cores, a fonte certa e aquele desenho matador e enxuto pra que o observador capte tudo numa fração de segundo e PÁ!, a mágica está feita!
Meu desenho é poluído, tem sempre muita informação e eu desisti de tentar mudar isso nessa altura do campeonato! O traço e a linha preta não me dão trégua e sempre regem a composição. Então quando me solicitam algum cartaz, pra algum lançamento, evento ou shows por exemplo, eu pratico uma tal resiliência em não tentar chegar num resultado final perfeito ( pro que seria um cartaz ideal ), mas tento encontrar na bagunça dos meus traços um resultado estético bacana e que comunique, convidando o observador a “perder um tempo” procurando detalhes e absorvendo a mensagem depois de um tempo namorando o cartaz. A mágica também acontece, mas é preciso um trabalho maior de observação e leitura.