Thiago Souto e a Av. Paulista – Parte #6: “Um certo desprendimento ajuda”

Chega ao fim hoje a série Thiago Souto e a Av. Paulista, na qual o quadrinista fala sobre os bastidores, as inspirações e as influências de seu mais recente trabalho. Por muito tempo tentei me convencer de que te amava (Balão Editorial) conta com a minha participação no papel de editor e narra um passeio pela principal via de São Paulo em um domingo, quando ela é fechada para carros e aberta para pedestres, ciclistas e skatistas. Nesse capítulo final da série, Souto fala sobre a repercussão inicial da HQ após seu lançamento na Comic Con Experience 2018, comenta os sentimentos dele em relação ao livro finalmente impresso e faz um balanço inicial do projeto.

Você confere todos os posts da série Thiago Souto e a Av. Paulista clicando aqui. Ao longo das últimas seis semanas, o autor expôs aqui no Vitralizado muitas das reflexões e dos sentimentos decorrentes da produção e do lançamento da HQ, sua primeira em seguida a Labirinto (Mino). No pé do post de hoje, como material bônus, dou um breve relato sobre essa minha parceria com o autor.

Aproveito a deixa para reforçar o convite: está marcado para sábado (15/12), na loja da Ugra (R. Augusta, 1371, loja 116, São Paulo), a partir das 16h, o evento oficial de lançamento de Por muito tempo tentei me convencer de que te amava. Eu estarei por lá com o Thiago Souto para uma conversa sobre a obra mediada pelo jornalista Thiago Borges, editor do blog O Quadro e o Risco, seguida por uma sessão de autógrafos com o autor. Vamos?

Thiago Souto e a Av. Paulista – Parte #6: “Um certo desprendimento ajuda”

“Espaço pra diálogo”

“Eu fiquei bem satisfeito com o livro impresso, ele ficou bonito e o formato é bem legal, agradável pra ler. É um livro pequeno, bom pra manusear. Acho que deu um espaço bom pros desenhos. Gostei muito da escolha que fizemos pro papel e a impressão ficou ótima. O resultado do livro, como produto e objeto, ficou ótimo. Isso teve reflexo na Comic Con, as pessoas pegavam, manuseavam e ficavam interessadas. Isso abre espaço pra diálogo”.

“Eu nunca tinha feito um quadrinho com papel Pólen, só tinha trabalhado com ele em outros projetos. Enquanto fazia os desenhos coloquei um fundo meio amarelado em algumas páginas e achei que ficou legal. Funcionou quase como uma terceira cor, junto com o preto e o magenta. Ao invés do branco, esse amarelinho funcionou pra mim como uma outra cor e tornou ainda mais confortável a leitura”.

“Todo mundo odeia a Berrini”

“É um quadrinho diferente do meus trabalhos prévios. Algumas pessoas me procuraram no evento por terem ouvido falar do livro pelas redes sociais ou por conhecerem o Labirinto – um projeto bem diferente esteticamente, em termos de formato e tudo mais. A reação mais comum foi, ‘nossa, é muito diferente do que você já fez’. Eu gosto dessas reações. Por se tratar da Paulista e pela relação do personagem com a Paulista, o livro também acaba gerando uma certa identificação com a impressão que as pessoas têm da avenida. É uma relação comum para quem gosta da Paulista e de São Paulo e que também considera esses locais um pouco hostis”.  

“Também ajudaram na Comic Con os prints que imprimi com imagens do livro. Algumas pessoas viam e se interessavam pela HQ. Quando eu falava que as imagens faziam parte do livro, criava-se esse interesse por ele. Mostrar uma imagem de São Paulo para quem é de São Paulo evoca sentimentos de pertencimento e identificação e também gera interesse pelo quadrinho”.

“E muita gente que não é de São Paulo também levou o livro. Apesar de se passar em São Paulo, o quadrinho trata de uma dinâmica de relacionamento comum para quem vive em cidades grandes. Às vezes uma pessoa é de uma metrópole e o sentimento que ela tem é muito parecido com o que é apresentado no livro. Também estamos falando de um marco da cidade, então talvez alguém de fora que tenha ido à convenção tenha levado como uma lembrança da cidade, da mesma forma que você compra um cartão postal de um marco local”. 

“Talvez se eu tivesse falando de outro marco conhecido apenas para paulistas… Não dá pra falar da [Avenida Engenheiro Luís Carlos] Berrini. Todo mundo conhece a Berrini aqui em São Paulo, mas lá fora ninguém conhece. E ninguém ama a Berrini em São Paulo, todo mundo odeia (risos)”

“Recompensa mais imediata”

“É estranha a sensação. Foram dois meses de produção e agora o livro tá pronto, sendo lançado. Isso é completamente diferente. É boa a sensação de publicar alguma coisa, de ver alguma coisa pronta e já ter algumas respostas. É tudo muito imediato e instantâneo. Você faz, tem um período de correria até fechar, a coisa fica pronta e é lançada. Comparativamente, o processo do Labirinto foi muito longo e penoso e tudo isso agora é novo para mim”.

“Embora no Mikrokosmos também tenha sido um processo muito rápido, acabou sendo muito mais solitário. No caso do Por Muito Tempo, por eu ter contado com você e com o Guilherme, acho que a recompensa foi mais imediata”.

“Passou só uma semana desse primeiro lançamento, então eu espero que seja um livro que ainda tenha um eco. O resto do balanço será saber qual vai ser esse eco e como será a repercussão ao longo dos próximos meses, o que vai reverberar. As pessoas vão continuar falando? No Labirinto teve isso: eu lancei e depois de muito tempo ainda continuam procurando. Eu tô curioso pra saber qual será a repercussão desse trabalho, principalmente por ele ter caraterísticas muito diferentes do Labirinto”.

“Um pouco mais ágil”

“A primeira lição é que mesmo trabalhando de forma independente é fundamental ter um editor. Foi uma descoberta saber que dificilmente vou querer trabalhar sem um editor. Faz bastante diferença ter com quem conversar, ter com quem dividir uma ou outra dúvida, ter alguém que possa acrescentar novas ideias ao trabalho. Acredito que isso seja bom não só para mim, mas para qualquer pessoa que vá começar a produzir. Mesmo que não seja um editor em termos formais, é bom ter por perto alguém que acompanhe o trabalho, uma ou outra pessoa que possa trazer ideias honestas, alguém comprometido em potencializar o trabalho”.

“Também foi legal trabalhar com uma editora diferente. A Balão tem uma estrutura diferente da Mino e um modo diferente de funcionar. É importante pra mim ter essas experiências distintas. Eu ainda tô no início da minha produção como quadrinista, ainda tenho que passar por muita coisa e acho muito importante viver esses processos diferentes. Existem jeitos diferentes de fazer um quadrinho e é preciso descobrir o que você prefere e onde se encaixa melhor. Essa experiência foi muito positiva nesse aspecto”.

“Já em relação ao processo de produção, eu desenvolvi esse desprendimento maior em relação ao que estava fazendo. Produzindo dentro de um prazo menor foi necessário aceitar muito mais aquilo que já foi feito. Não dá tempo de ficar revisitando o que já está pronto e já foi incorporado ao trabalho. Isso talvez traga um pouco mais de agilidade para trabalhos futuros, mesmo que eles sejam mais longos, e também me deu um pouco mais de confiança. Tá feito e não dá mais tempo de mudar? Segue em frente. No final deu certo. Claro que é sempre bom planejar e pensar bem antes de fazer as coisas, mas ter um certo desprendimento também ajuda, seja qual for a proporção do trabalho”.

BÔNUS

Nota do editor, por Ramon Vitral

Por muito tempo tentei me convencer de que te amava é a minha quarta experiência como editor de histórias em quadrinhos, a primeira em um livro impresso. Eu editei as 17 edições dos dois primeiros anos da Série Postal, trabalhei com o quadrinista Jão no desenvolvimento da ainda inédita PARAFUSO ZERO – Expansão e ainda estou envolvido em um projeto ainda não anunciado por seu autor. Ou seja, apenas uma dessas três empreitadas foi impressa, mas sendo a edição dos postais uma experiência completamente distinta da parceria com Thiago Souto no desenvolvimento de uma publicação longa.

Ainda tenho pouca bagagem como editor e a minha atuação no quadrinho de Thiago Souto se deu principalmente por meio das conversas constantes que mantivemos ao longo do período de produção da obra. Como jornalista, escrevendo sobre HQs e atualizando quase diariamente o blog, um dos meus principais objetivos sempre foi tentar compreender um pouco melhor a mente de um artista, entender melhor como alguém pensa um quadrinho, conhecer alguns dos métodos e das técnicas e acompanhar cada etapa da produção de um gibi. Editar Por muito tempo foi realizador nesses aspectos e me instigou a aprofundar ainda mais essas investigações pessoais.

Estou muito feliz pelo quadrinho que chega às lojas e tenho certeza que prendi um monte com o Thiago e com o Guilherme Kroll, editor e sócio da Balão Editorial (responsável por publicar a HQ). Agradeço aos dois pela confiança e recomendo procê a leitura imediata da HQ e dos seis posts da série Thiago Souto e a Av. Paulista. É provável que outros projetos do tipo sejam assunto aqui no Vitralizado em 2019, mas enquanto isso, deixo novamente o convite pro lançamento da HQ no sábado (15/12). Nos vemos por lá?

FIM

ANTERIORMENTE:
>> Thiago Souto e a Av. Paulista – Parte #6: “Um certo desprendimento ajuda”;
>> Thiago Souto e a Av. Paulista – Parte #5: “Um processo mais intuitivo”;
>> Thiago Souto e a Av. Paulista – Parte #4: “Um quadrinho com um título imenso”;
>> Thiago Souto e a Av. Paulista – Parte #3: “Experimento voltado para a desconstrução”;
>> Thiago Souto e a Av. Paulista – Parte #2: “É muita gente diferente compartilhando o mesmo espaço”;
>> Thiago Souto e a Av. Paulista – Parte #1: “Parecia coisa de ficção científica”.

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Ramon Vitral

Meu nome é Ramon Vitral, sou jornalista e nasci em Juiz de Fora (MG). Edito o Vitralizado desde 2012 e sou autor do livro Vitralizado - HQs e o Mundo, publicado pela editora MMarte.

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